Universidade
Em reunião com a Adusp, chapa “USP Novo Tempo” promete, caso eleita, manter diálogo permanente; fala em “reavivar a Assembleia Universitária”; e alega que “fundações são necessárias frente à grande dificuldade que tem a universidade de fazer seus gastos”
No dia 14 de novembro, a Diretoria da Adusp recebeu para uma conversa na sede da entidade o candidato a reitor Marcílio Alves e a candidata a vice-reitora Sílvia Casa Nova, que compõem a chapa “USP Novo Tempo”, uma das três chapas inscritas no atual processo sucessório. Representaram a Diretoria da Adusp o professor Márcio Moretto, presidente da entidade, e a professora Michele Schultz, ex-presidenta. O principal tema da conversa, realizada a pedido da chapa, foram as questões programáticas em jogo na atual eleição de reitor(a) e vice-reitor(a).
A primeira questão abordada na conversa foi a inexistência de diálogo entre a Reitoria e a Adusp. “Principalmente nesse período de eleição, não raro [as chapas] vêm nos procurar, a gente conversa, mas depois, quando tem a gestão propriamente, tem sido difícil esse diálogo. A gente não consegue marcar reuniões, ou manda e-mails e não tem respostas”, disse Moretto. Daí a preocupação de questionar todas as chapas quanto à sua futura relação com a Adusp em caso de vitória.
“A gente tem uma proposta de Reitoria que a gente não chama itinerante, eu não achei um adjetivo ainda, mas que a Reitoria possa atuar também em outros câmpus, e não para fazer visita, mas para ficar lá por um tempo, uma semana, depois outra semana em outro câmpus etc. A gente acha que isso é importante para a Reitoria”, principiou Marcílio. “E por que eu estou falando isso? Porque quando nós falamos isso em São Carlos, no ICMC [Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação], um professor disse assim: eu ouço essa promessa há anos, e nunca é cumprida”.
O candidato a reitor comparou a promessa citada pelo docente do ICMC à promessa de diálogo de chapas que, quando efetivamente assumem a Reitoria, a descumprem. “A resposta que eu dei para ele é olhar a nossa história, nossa palavra de que é muito importante o encontro com a Adusp, e que seja em bases regulares, e não em bases de crise. Eu não vejo nenhum problema em recebê-los de modo regular, não há nenhuma concessão que é feita por parte da Reitoria”, destacou Marcílio. “Então, vocês têm o meu compromisso e da Sílvia também. Nós não combinamos essa resposta, mas temos esse compromisso de que a gente vai estar sempre em contato com vocês, a todo instante, não vejo nenhum problema”.
Noutro ponto da conversa, Marcílio Alves definiu a proposta de uma eventual gestão da chapa como “Reitoria desencastelada, fora do sétimo andar” [referência à localização do gabinete no prédio da Administração] e disse que estará aberto a receber grupos e entidades para discutir pautas e demandas.
O presidente da Adusp ponderou que, nos períodos de negociação da data-base, as conversas entre o Conselho de Reitores das Universidades Estaduais Paulistas (Cruesp) e o Fórum das Seis têm ocorrido com certa normalidade. Porém, nas últimas gestões reitorais, tem sido praticamente impossível debater com a Reitoria da USP as pautas específicas dos docentes, que não são objeto das reuniões com o Cruesp.
Marcílio disse então que é filiado à Adusp e citou matérias publicadas pelo Informativo Adusp Online sobre sucessivas reuniões solicitadas à Reitoria e invariavelmente frustradas: “Eu vejo, eu leio, e sempre ‘reitor não recebe, reitor não recebe’, depois manda [a pauta] para o chefe do gabinete”.
Há certas decisões “que entram no campo da política e que é interessante o reitor receber a Diretoria da Adusp”, lembrou Michele. “Aconteceram três reuniões com a atual gestão, e aí aconteceu uma divergência — uma crise, como você colocou — e eles deixaram de nos receber. A última reunião foi no primeiro semestre de 2023, se não me engano”, relatou. Lembrou que a Reitoria chegou a acordar pelo menos uma reunião por semestre, o que não ocorreu.
Marcílio, então, reiterou a palavra empenhada. Sílvia reforçou: “Nossa história tem sido essa, de representação, de diálogo, de interlocução. Não é alguma coisa que a gente está dizendo agora, é uma coisa que a gente tem feito. Tanto que a gente vai ter essa conversa com o DCE, que também é muito importante, que também é um grupo que precisa ser ouvido”.
Sobre o debate proposto pela Adusp às três chapas, Marcílio alegou complicações de agenda. “Nós até consideramos participar do debate que vocês nos convidaram, mas foi questão de agenda. Estava muito enrolada a agenda. Mas a gente também não teria nenhum problema em participar do debate”, disse.
Michele comentou, então, que no corpo docente existe um entendimento de que o atual processo sucessório caracteriza-se pela ausência de debate. “Porque a avaliação é de que o que ocorreu não foi debate”, acrescentou, referindo-se ao evento organizado pela Comissão Eleitoral.
“Não, a gente está chamando de sabatina”, respondeu Sílvia. “Pasteurizar”, completou Marcílio. “Com a IA [inteligência artificial] da Reitoria escolhendo as perguntas”, ironizou.
Reforma administrativa, reforma tributária e financiamento da USP
Outra questão abordada na conversa foi a reforma administrativa, que está começando a tramitar no Congresso Nacional. Se aprovada, a reforma afetará os direitos do funcionalismo público em todas as esferas e níveis e portanto também das e dos docentes das universidades públicas estaduais de São Paulo. O projeto de lei prevê explicitamente o fim da licença-prêmio e dos quinquênios. “É uma das coisas que nos preocupa como entidade”, enfatizou o presidente da Adusp.
Moretto também citou a reforma tributária, que já está aprovada e será implementada aos poucos a partir de 2026. Frente à extinção do ICMS, a proposta do Fórum das Seis é substituir o atual repasse de 9,57% da quota-parte estadual do ICMS por um repasse de 8,64% da Receita Tributária Líquida (RTL) do estado para as universidades estaduais paulistas. “Ela não está em confronto com as propostas que vêm do Cruesp, mas queria dividir com vocês [da chapa ‘USP Novo Tempo’] e ouvir de vocês como estão vendo essas duas medidas. Necessariamente a universidade tem que reagir. Porque nos afeta diretamente”, disse.
Sílvia abordou a questão da reforma tributária. “Já está sendo formado um comitê que vai cuidar do IBS [Imposto sobre Bens e Serviços], que vai ser compartilhado entre os estados e municípios. Apesar de termos propostas, não existe uma interlocução que assegure para Unicamp, Unesp e USP a transferência de recursos do Estado para as universidades como tem sido. E muda a base. Porque a base era a quota-parte do ICMS, e o ICMS vai ser extinto, e essa é a preocupação. Qual vai ser a sistemática que vai substituir essa?”, questionou.
“O nosso ponto, e isso eu acho que é muito, muito forte na nossa proposta, precisa haver uma interlocução que, primeiro, é técnica, que bom que já tenhamos propostas, que é ter uma proposta para podermos levar; a segunda interlocução é essa acadêmica, é nos juntarmos à Unesp, à Unicamp, que vão passar pelo mesmo processo, para irmos unidas; e a terceira é a política. É aí que vai precisar de uma força grande de interlocução política para assegurar. Isso está ligado diretamente à autonomia financeira das universidades.”
Moretto explicou que, frente às incertezas ligadas ao IBS, “que ainda não existe”, o Fórum das Seis optou por adotar um modelo de financiamento semelhante ao vigente para a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), que recebe 1% das receitas tributárias líquidas do estado. “Hoje, toda vez que tem a LDO [Lei de Diretrizes Orçamentárias], a gente pede 9,57% do ICMS. Então a gente passaria a pedir 8,64% das receitas tributárias líquidas”, explicou o presidente da Adusp. “As reitorias estão dando a esse tema menos atenção do que deveriam.”
A chapa “USP Novo Tempo” não se comprometeu com a proposta do Fórum das Seis. “Como chapa, a gente pensa em promover no primeiro semestre um encontro, um seminário, com juristas e tributaristas da USP, para se anteciparem com projetos de lei que iriam na direção dessas discussões, não sei se exatamente nesse modelo, mas precisa invocar a capacidade técnica da USP, e isso pode ser junto com Unicamp e até Fapesp também, para que a gente possa enfrentar esse problema”, disse Marcílio.
O candidato considera interessante a proposta do Fórum das Seis. No tocante à “percepção da população em relação aos gastos que a universidade tem”, ele defende “uma comunicação muito boa, muito eficaz com a população, para mostrar que vale a pena ‘consultar o universitário’, como se fala”, ou seja: “Consultar o universitário para os problemas, para as crises, para as demandas, etc.”.
Moretto lembrou que pode haver um horizonte comum com o Cruesp na questão do financiamento das universidades públicas estaduais. Os representantes da Adusp informaram à chapa “USP Nosso Tempo” que os 8,64% da RTL equivalem a cerca de 10% da quota-parte estadual do ICMS, de modo que, caso tal proposta realmente venha a ser adotada, implicará repasse maior que o atual, que se encontra defasado frente à grande expansão da USP, Unesp e Unicamp ocorrida nas décadas de 2000 e 2010.
Michele ponderou que o próprio Cruesp, em determinado momento, já reivindicou ao governo estadual e à Alesp um aumento do atual índice de repasse de ICMS, que passaria a ser de 9,9% da quota-parte estadual. “E aí, quando você fala de chamar juristas e tributaristas, já me preocupa porque, por exemplo, se for chamar a Nina Ranieri [docente da Faculdade de Direito e ex-secretária-geral da USP], ela tem uma visão de autonomia que é diferente da que nós temos. Então nós defendemos a autonomia de gestão financeira, e não autonomia financeira.”
Autonomia financeira, explicou a ex-presidenta da Adusp, permite outras formas de financiamento da universidade, como os endowments, os fundos patrimoniais. “Então queria também perguntar a opinião de vocês sobre isso. Porque assistimos ao Carlotti dando um tiro no pé na Alesp, quando foi defender os endowments. E ele foi atacado exatamente pela extrema-direita: ‘Então a gente pode diminuir o financiamento público, porque vocês estão angariando fundos no setor privado para financiamento da universidade’. Pergunto qual é a opinião de vocês sobre o financiamento público e sobre essas iniciativas de financiamento privado, não só para manutenção da universidade, mas também da pesquisa.”
Sílvia Casa Nova contrapôs, fazendo referência às propostas da chapa: “A gente acredita que essa defesa da autonomia financeira, e a gente chama de autonomia financeira, vem da USP e permanecer o que ela é: universidade pública e gratuita. E a gente acrescenta a ideia de que ela seja guardiã de valores democráticos. Mas por que a gente diz isso? Porque essa liderança que a gente ocupa, ela ocupa da gente permanecer o que nós somos hoje. Isso é para nós e para Unesp e Unicamp também”, sugeriu.
“Por isso que o Marcílio fala também da questão de comunicar, da universidade reforçar uma narrativa em que ela é a universidade pública e gratuita que tem esse espaço de defesa dos valores democráticos e direitos humanos. É por aí que nós vamos”, continuou a candidata a vice-reitora. “Eu não sabia dessa diferenciação, sendo muito sincera, entre a autonomia financeira e a autonomia de gestão financeira”, disse a candidata a vice-reitora.
Assembleia Universitária e consultas comunitárias para ampliar democracia
No tocante à questão da ampliação da democracia na USP, Marcílio citou a proposta da chapa de “rever e reavivar o conceito de Assembleia Universitária”, instância que já existe no Regimento e no Estatuto, de apoio ao Conselho Universitário quando da tomada de decisões importantes (como nos processos sucessórios na Reitoria). “Quando a gente faz essa consulta a essa grande base a gente tem uma opinião melhor. A Assembleia Universitária está no foco do nosso trabalho em termos de representatividade do que a gente entende que é bom para a universidade.”
Porém, o presidente da Adusp questionou a representatividade dessa instância, que é formada pelos(as) integrantes das congregações e dos conselhos centrais. “Uma das nossas preocupações é que na Assembleia os servidores técnico-administrativos e os estudantes são muito sub-representados”, disse Moretto, apontando que, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), os colegiados que constituem a Assembleia deveriam contar com pelo menos 15% de estudantes e 15% de funcionários(as) técnico-administrativos(as).
Marcílio respondeu que “remeteria esse problema para a Assembleia Universitária”, para ela resolver como quer essa representação. “Porque tem muitas respostas que o reitor poderia induzir, mas ele não deve induzir todas as coisas. Ele deve escutar. E isso está muito ligado ao nosso perfil de escutar e ver o que eles acham sobre isso”.
Assim, a chapa se propõe a adotar mecanismos já existentes, como a Assembleia Universitária e a consulta comunitária: “Ambos são utilizados no momento da eleição, mas não voltam a ser utilizados em outras discussões que são importantes. A gente quer passar a utilizar”, disse Sílvia. “O processo de democratização da universidade passa por uma discussão mais ampla e esses mecanismos podem ser usados para isso.”
Ademais, no entender de Marcílio a USP “precisa ser mais discutida”, sendo que tempos atrás havia “mais grupos conversando sobre a universidade”, ao passo que atualmente ela “ficou muito isolada, ela está muito morta nessa atividade política dela”, e por outro lado a diferença que existe entre os diversos câmpus “é muito grande”, destacou, e exige a realização de uma série de debates.
Nesse momento, Michele pontuou que a Adusp defende o fim da lista tríplice e que a eleição de reitor(a) e vice-reitor(a) passe a ser direta, de modo que o processo eleitoral possa começar e terminar na própria universidade, pondo fim à nomeação do reitor ou reitora pelo governador da vez. “É paradoxal a universidade fazer eventos em defesa da democracia, mas, de fato, o próprio processo em curso não reflete aquilo que a universidade defendeu na Faculdade de Direito, em agosto do ano retrasado”, sustentou.
“Nós somos candidatos, nós fizemos a inscrição e aceitamos as regras do jogo naquele momento. E as regras do jogo são colocadas. Para mudar essas regras do jogo, a gente precisa mudar a Constituição do Estado, que dá direito ao governador [de] escolher”, respondeu Marcílio. “E isso tem muito de movimento. Tem essa coisa do movimento da universidade como um todo fazer essa reclamação nesse momento. Mas, depois que passou o processo eleitoral, isso se esquece e só se volta a falar dessa representação daqui a quatro anos.”
Na verdade, é o próprio Estatuto da USP, atualizado pela Resolução 6.637/2013 (gestão J.G. Rodas), que, no artigo 36, reza: “O Reitor e o Vice-Reitor, Professores Titulares da USP, serão nomeados pelo Governador do Estado, de lista tríplice de chapas […]”.
Inclusão, pertencimento e permanência estudantil
Michele Schultz introduziu a questão da inclusão e pertencimento, ressaltando que a criação da pró-reitoria destinada à área (PRIP) se deve ao movimento de docentes e discentes, marcado por momentos como a formação da Rede Não Cala!, em 2016. No entanto, considera, “as políticas estão muito frágeis, “seja, por exemplo, na forma como se definiu a reserva de vagas para docentes negros, seja na ausência de uma política efetiva para a inclusão de pessoas com deficiência”.
Nesse ponto, citou o caso das professoras surdas contratadas pela USP, que dependem dos serviços de intérpretes de Libras, oferecidos por meio de empresas terceirizadas. A professora mencionou também a questão da permanência estudantil e a importância do investimento nessas políticas.
Sílvia Casa Nova relatou que vem da contabilidade, área de atuação predominantemente masculina, e que sempre estudou a presença das mulheres em diversas áreas. Em 2013, foi cofundadora do Generas – Núcleo de Pesquisa e Extensão em Gênero, Raça e Sexualidade da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA). “Estudos sobre questão de políticas afirmativas, tanto para docentes quanto para discentes, são foco da nossa atuação”, disse.
A professora ressaltou que a chapa tem um projeto piloto para a presença de intérpretes de Libras e que aposta na interlocução com os grupos, como o Coletivo de Docentes Negras e Negros da USP, “porque são eles e elas que sabem quais são os problemas e sabem também quais são as melhores soluções”.
“A PRIP foi importantíssima”, considera a candidata a vice-reitora, embora tenha sido “uma resposta tardia da universidade”. Na sua avaliação, a adoção de cotas trans para docentes será uma das próximas demandas que a universidade deve enfrentar.
“Nós já temos docentes trans, e precisamos saber que ambiente esses docentes têm encontrado nas suas respectivas unidades, e temos que dar atenção a essa demanda também. A nossa preocupação é fazer em diálogo, em interlocução, e não chegar com medidas sem a participação desses grupos, e usar de novo a consulta à comunidade e a Assembleia Universitária para acelerar processos”, explicou.
Sílvia destacou que alguns programas de pós-graduação têm adotado ações afirmativas por conta própria, uma vez que não há uma política institucional da universidade. “Nossa intenção é também fazer um mapeamento daquilo que tem acontecido nos programas de pós-graduação, para primeiro criar uma diretriz e, segundo, usar isso para informar uma política mais ampla”, disse. Além do mapeamento e da criação das diretrizes no caso da pós, o programa da chapa prevê uma ampliação das políticas afirmativas para diversos grupos, reforçou.
A professora também defendeu que é preciso avaliar as políticas já adotadas por outras universidades, como o vestibular indígena e as cotas para alunos(as) trans, no caso da Unicamp, por exemplo.
Marcílio Alves disse que, em relação às creches, a proposta é de criação de pelo menos uma unidade em cada câmpus. O candidato defendeu também o investimento no Hospital Universitário (HU), que considera “um equipamento de ensino fundamental”. “Queremos preservar e fazer uma reforma estrutural grande e uma reforma de processos no HU”,
Márcio Moretto observou que, em relação à permanência estudantil, o Fórum das Seis tem cobrado que as três universidades estaduais paulistas adotem políticas mais uniformes.
O presidente da Adusp também mencionou a ação civil pública ajuizada pela Defensoria Pública de São Paulo que questiona os processos de entrada de docentes pretos, pardos e indígenas (PPI) na USP, definidos pela Resolução 8434/2023. Uma pesquisa feita pela Rede Liberdade e pela Ação Educativa mostra que a proporção de docentes negros e negras passou de 2,64% para apenas 3,96% entre 2022 e 2025. Porém, cerca de 800 vagas de concursos já abertos por editais na época não foram contemplados pelos efeitos da resolução.
Na avaliação da Adusp, no período a universidade ficou “devendo” cerca de 175 vagas para docentes negros e negras e deveria reservar esse número nos próximos processos de contratação.
Papel das fundações privadas ditas “de apoio”
Moretto e Michele questionaram a chapa a respeito do papel das fundações privadas e também sobre outros caminhos de privatização na universidade, como a abertura para a flexibilização do Regime de Dedicação Integral à Docência e à Pesquisa (RDIDP), além dos valores envolvidos em convênios, que acabam por propiciar remuneração extra para docentes.
Marcílio iniciou suas considerações dizendo que nunca deu cursos em fundações e nem foi muito simpático a elas, mas aprendeu a entender o seu papel quando foi convidado a ser o diretor executivo da Fundação de Apoio à USP (FUSP). A candidata a vice-reitora é diretora financeira da FUSP. Ambos estão afastados para participar da campanha eleitoral.
“As fundações são necessárias frente à grande dificuldade que tem a universidade, como autarquia, para fazer seus gastos. Essa dificuldade leva a uma lentidão nos processos de execução, o que acaba não sendo adequado para o resultado em si. Então, a fundação acaba sendo uma ponte interessante e ágil, rápida, para que as empresas, as forças do governo e as entidades do exterior possam fazer os projetos conosco”, disse Marcílio.
O professor citou como exemplos projetos com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o recebimento de emendas parlamentares e o convênio da Prefeitura Municipal de São Paulo com o Hospital Veterinário da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ), além de convênios com empresas como a Petrobras e a Shell.
“E a FUSP tem muita agilidade para fazer isso porque é uma organização do terceiro setor. Ela não segue a Lei das Licitações [Lei 14.133/2021], mas quando os custos são muito grandes, como o projeto de aquecimento da piscina do Cepeusp, que a gente está fazendo, tem que licitar”, explicou.
Além disso, prosseguiu Marcílio, a FUSP “tem todo o controle do Ministério Público, do Tribunal de Contas, das empresas que são participantes dos projetos”. “É comum aparecer lá a Petrobras com a sua equipe, ou a Shell. Deixo só esses dois exemplos, mas as empresas vão lá perguntar sobre nota fiscal, pagamento de valores, um monte de detalhes.” A fundação também contratou auditorias “para que a gente tenha o conforto jurídico de que tudo está sendo seguido conforme a lei”.
Questionado por Moretto sobre o modelo a ser adotado na relação da Reitoria com as fundações numa eventual gestão, Marcílio afirmou que já há “um modo bem estabelecido, que é feito com mais ou menos dez fundações, e acho que todas as fundações trabalhando com a USP teriam que seguir esse regulamento”.
“Esse regulamento prevê [o repasse] de uma parte dos valores dos projetos para a Reitoria”, prosseguiu. Esse repasse, dependendo da instituição ou empresa com a qual é feito o projeto, pode ser de 4% ou 5% a até 10%. “Essa relação já está bem estabelecida entre USP e FUSP, mas precisa ser também expandida para outras fundações para que se tenha um regulamento comum entre elas, um funcionamento comum”, defendeu.
Tanto Marcílio quanto Sílvia defenderam a importância da transparência na gestão dos projetos. “Todos os relatórios contábeis e financeiros [da FUSP] estão disponíveis. E eles estão disponíveis com pareceres auditórios completos, com notas explicativas para quem queira ler e entender esses números”, disse a professora. “E, além disso, nos últimos dois anos, a gente preparou um relatório que a gente chama de Relatório Social, que dá exemplos dos projetos que a fundação gerencia e olha também os impactos desses projetos.”
Por ser uma organização de terceiro setor, a FUSP tem “obrigações de prestar contas mais amplas, exatamente pelos benefícios que ela tem sendo uma fundação”.
As fiscalizações pelas quais a fundação passa “são imensas”, definiu Sílvia. “É possível fazer essas fiscalizações com as fundações conveniadas, porque a primeira fiscalizadora da fundação de apoio é a própria universidade. Depois vêm o Ministério Público e o Tribunal de Contas do Estado.”
A professora também ressaltou que a transferência de fundos só tem “uma direção”. “Não há fluxo de recursos da universidade para a fundação, é só na direção oposta, da fundação para a universidade. Esses percentuais que o Marcílio citou são recursos transferidos da FUSP para a universidade. Lógico que nós estamos falando da FUSP, porque é a fundação que nós conhecemos.”
Os recursos podem ser dirigidos para a Reitoria, mas também para uma unidade ou mesmo departamento, “desde que a unidade assim acorde, porque também a fundação está limitada à norma que for definida pela própria unidade nos seus projetos”.
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