Universidade
Sob pressão, Reitoria antecipa contratação de 35 docentes na FFLCH; crise na Letras, porém, tende a persistir
Nesta quarta-feira (30/8), o reitor Carlos Gilberto Carlotti Jr. anunciou uma nova antecipação de “claros docentes”, desta vez para a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), num total de 35 cargos de professor(a) que já estavam destinados a esta unidade mas que, dentro dos planos de “escalonamento” adotados pela Reitoria, somente seriam preenchidos mediante contratação em 2024 e 2025.
Avalizada pela Comissão de Claros Docentes (CCD), a antecipação na FFLCH procura responder à intensa mobilização de estudantes de Letras, que terça e quarta-feira (29 e 30/8) realizaram sua segunda paralisação neste ano, em protesto contra a situação de quase colapso da maioria das habilitações do curso. Além disso, a antecipação foi comunicada apenas dois dias depois de entrevista do reitor ao programa “Roda Viva” (TV Cultura), durante a qual ele precisou responder a contundentes questionamentos de jornalistas sobre a falta de docentes nos cursos de Letras e de Artes Visuais.
O plano do reitor de 876 contratações que ocorreriam de forma “escalonada” ao longo de seu mandato (terminando portanto em 2025) está fazendo água por todos os lados, a ponto de uma repórter da Folha de S. Paulo haver inquirido Carlotti Jr. no “Roda Viva” quanto a um eventual “erro de diagnóstico” no tocante ao número de docentes que a Reitoria pretende contratar.
O déficit atual, conforme levantamento da Adusp baseado na folha de pagamentos e no Portal da Transparência da USP, é de 1.039 docentes, comparativamente ao quadro existente na universidade em 2014. Qualquer observador isento percebe de imediato não apenas que 1.039 é maior que 876, como também que haverá neste ano e nos próximos, dentro dos padrões estatísticos da USP, centenas de aposentadorias, além de falecimentos e desligamentos voluntários de docentes.
De modo que, ao contrário do que vem afirmando o reitor, sua promessa (feita enfaticamente no “Roda Viva”) de que, com seu “pacote” de 876 contratações, o corpo docente retornará ao tamanho que tinha em 2014 é inverídica e contraditória com a realidade dos números, a não ser que haja intenção ainda não anunciada de mais contratações.
Primeira “antecipação de claros” ocorreu após ocupação discente da EACH
Outros cursos têm se rebelado contra a postura intransigente da Reitoria. É bom lembrar que a primeira antecipação expressiva de “claros docentes” resultou de uma negociação, semanas atrás, entre o movimento estudantil da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH), que havia ocupado a unidade, e o reitor, que foi literalmente cercado por estudantes durante uma visita ao Câmpus Leste.
Por outro lado, o curso de Artes Visuais da Escola de Comunicações e Artes (ECA), que neste ano perdeu nada menos do que 11 disciplinas por falta de docentes, continua mobilizado em busca de reposição, e nesta quarta (30/8) estudantes levaram seu protesto e suas reivindicações para a frente da Reitoria.
Até o momento foram distribuídos 25 claros docentes para a FFLCH, referentes a 2022/2023, segundo o comunicado assinado pelo reitor (que acumula o cargo de presidente da CCD). “Além dos 20 claros distribuídos por meio do Ofício GR/CIRC/109, outros 2 claros foram destinados aos CEPIDs-Centro de Estudos da Metrópole (CEM) e Núcleo de Estudos da Violência; 2 distribuídos por meio do Edital CCD 001/2022; e 1 claro destinado ao Curso de Libras. Dessa forma, a CCD decidiu pela antecipação dos 35 (trinta e cinco) claros referentes ao período de 2024 e 2025”.
A CCD recomenda à FFLCH que proponha “uma nova distribuição do quadro anteriormente previsto, priorizando as áreas deficitárias”, o que demonstra que finalmente a Reitoria reconhece a existência de um déficit no âmbito da atual distribuição de cargos docentes.
Porém, para não perder o hábito, a CCD neste documento continua a fazer exigências incongruentes. “Além disso, a Unidade deverá enviar um plano individualizado de atividades de ensino, pesquisa e extensão para cada cargo, conforme mencionado no item 5 do Oficio GR/CIRC/109, de 27/4/2022”, diz o comunicado assinado pelo reitor.
Nova paralisação de Letras demonstra crescente organização de estudantes
Tudo indica que a antecipação de “claros docentes”, mesmo que mitigue situações pontuais mais críticas das habilitações de Letras, não resolverá a profunda crise atual, provocada pela aguda escassez de docentes. Prova disso é a combatividade demonstrada pelo(a)s estudantes, que na luta pela reposição do corpo docente estão se organizando paulatinamente em cada uma das habilitações com a finalidade de construir uma greve.
“Depois de recorrer a todas as instâncias burocráticas envolvidas na contratação de professores, o curso de Letras decidiu que era hora de subir o tom. Em uma assembleia de dois turnos foi deliberada uma paralisação do curso nos dias 29 e 30 de agosto, cerca de 600 participaram e votaram na assembleia”, relatou ao Informativo Adusp Online a direção do Centro Acadêmico de Estudos Linguísticos e Literários Oswald de Andrade (CAELL).
“Para organizar a paralisação e, a exemplo da comissão de Japonês, todas as habilitações ativaram comissões compostas por todos os alunos interessados com a finalidade de construir um calendário de mobilizações durante os dias de piquete”, explicam o(a)s representantes.
Ainda de acordo com o CAELL, as atividades contaram com a presença de diverso(a)s professore(a)s de todos os departamentos, “que compuseram mesas em aulas públicas pautando a situação específica de cada habilitação e departamento, a importância da defesa da universidade pública e como os estudantes podem construir uma greve”.
Déficit de docentes gera sobrecarga e adoecimento, diz presidenta da Adusp
“O déficit de docentes, assim como o de servidores(a)s técnico-administrativos(a)s, além de comprometer o oferecimento de disciplinas e a realização de várias atividades acadêmicas, gera sobrecarga de trabalho, o que tem desencadeado uma série de consequências, entre elas o adoecimento”, diz a presidenta da Adusp, professora Michele Schultz.
“Temos acompanhado a queda na composição do quadro docente da USP e é evidente que as vagas reiteradamente anunciadas pelo reitor não recomporão os números referentes a 2014, a não ser que o plano da Reitoria seja o de recompor os quadros pela via da precarização do trabalho docente, como foi feito recentemente com o ‘Programa de Atração e Retenção de Talentos’ (PART), ou pelo uso inadequado de contratações temporárias”, prossegue.
Na avaliação da presidenta da Adusp, é urgente que a Reitoria resolva a situação dos cursos que estão prejudicados e que as vagas não sejam ofertadas pela via da concorrência entre departamentos e unidades. “Após aposentadorias, falecimentos ou exonerações, as vagas têm de ser automaticamente disponibilizadas para as unidades”, defende.
Fortaleça o seu sindicato. Preencha uma ficha de filiação, aqui!
Mais Lidas
- Instituto de Psicologia confere diploma póstumo a Aurora Furtado, assassinada pela Ditadura Militar, em cerimônia tocante que também lembrou Iara Iavelberg
- Maioria governista na Alesp aprova em primeiro turno a PEC 9/2023, que corta verba da educação paulista
- Conselho Universitário vai debater na terça-feira (15/10) concessão do “Prêmio Desempenho Acadêmico”, em três parcelas de R$ 3 mil, e valores para progressão na carreira dos(as) funcionários(as)
- Processo disciplinar que ameaça expulsar cinco estudantes da USP terá oitivas de testemunhas de defesa e de acusação nos dias 13 e 14 de novembro
- “Existe uma parceria com o Batalhão de Engenharia e não há razão que desabone o pedido”, e Reitoria da USP “está de acordo”, diz prefeito do câmpus a respeito de cessão da EEL para treinamentos do Exército