Decorridos praticamente 30 anos desde a instituição da Unidade Real de Valor (URV), no governo Itamar Franco, urge obter uma resolução definitiva para a questão do cumprimento da sentença judicial, transitada em julgado, que dá ganho de causa aos e às docentes representados(as) pela Adusp, prejudicados(as) nos seus vencimentos, quando da conversão, pela USP, de cruzeiros reais para URV.

Afinal de contas já se passaram 11 anos do ingresso da ação, dez anos do acórdão do Tribunal de Justiça (TJ-SP) em favor da Adusp e quase sete anos da decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que em novembro de 2018 julgou e negou os recursos da USP que visavam a esvaziar a lista das(os) beneficiários.

Também não se pode esquecer que 223 docentes já faleceram ou foram desligadas(os) durante o curso da ação, conforme indicado pela própria universidade.

Mais recentemente, o TJ-SP manifestou-se novamente duas vezes no caso, em ambas para dar razão à Adusp.

Conforme noticiou o Informativo Adusp Online, em setembro de 2023 a 3ª Câmara de Direito Público do TJ-SP deu provimento a um recurso da Adusp contra a decisão do juiz de primeira instância de extinguir, na fase de execução da sentença, o processo referente à ação interposta pela Adusp, com base na tese da USP de inexistência da obrigação de fazer. Na ocasião, mesmo com a decisão já transitada em julgado, a USP insistia na tese de ocorrência de “prescrição”, alegando reestruturação da carreira docente após a instituição da URV e antes do ingresso da ação pela Adusp. A 3ª Câmara de Direito Público, assim, afastou novamente a tese vencida durante o conhecimento da ação.

Inconformada, a USP mais uma vez opôs embargos de declaração ao acórdão, insistindo novamente na tese de prescrição e alegando a inexequibilidade da decisão em razão das diversas situações existentes entre as(os) docentes potencialmente beneficiárias(os) da decisão judicial, a saber: aquelas(es) que já eram docentes em março de 1994 e que eram filiados à Adusp em janeiro de 2013.

A USP requereu ainda que, se afastada a tese da prescrição, deveria ser reconhecida a inaplicabilidade da decisão para diferentes grupos de docentes segundo categorização apresentada pela universidade, com destaque para professoras(es) com vínculos precários e aquelas(es) detentores de novo vínculo com a USP por aprovação em outro concurso e provimento em outro cargo, com direito eventual, em função da data do novo concurso, a mero pagamento retroativo.

Decisão beneficia cerca de um terço das(os) docentes representadas(os) na ação

Já julgados os embargos declaratórios, no último dia 22 de fevereiro nova decisão da 3ª Câmara de Direito Público do TJ-SP manteve o acórdão quanto ao afastamento da prescrição, já decidido, destacando a indevida insistência da USP nesse tocante. Manteve também a parte da sentença do juiz de primeira instância em fase de execução, que restringiu a lista de beneficiários a associadas(os) da Adusp, excluindo inicialmente vários grupos do alcance da decisão.

Dessa forma, nessa nova e última deliberação, o TJ-SP confirma a exclusão dos seguintes grupos de docentes, assim categorizados pela USP:

a) 569 que ingressaram como docentes após março de 1994;

b) dois falecidos antes da propositura da ação;

c) 36 que tinham vínculo jurídico regido pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) em março de 1994;

d) quatro que não estariam na relação inicial de associadas(os) porque afastadas(os) com prejuízo de vencimentos;

e) 44 que não faziam parte da carreira docente porque vinculadas(os) a outras entidades diversas da USP, identificadas(os) como as(os) professoras(es) de museus e órgãos especializados;

f) 769 professoras(es) que eram docentes precárias(os) em 1994 e, posteriormente, se efetivaram por meio de novo concurso público;

g) 223 que foram desligadas(os) no curso da ação, por força de exoneração ou falecimento.

Isso significa que apenas cerca de um terço da lista original de docentes representadas(os) na ação estaria apto para seguimento no curso do processo, com o cumprimento da obrigação da USP de, primeiramente, incorporar o aumento de 6,49% aos seus vencimentos.

Quanto às e aos demais excluídas(os), à exceção dos casos referidos nas letras a, b, e c, o Departamento Jurídico da Adusp entende que permanece válida a tentativa de reverter essa decisão em seu favor, por meio de recursos processuais ainda cabíveis, e ingressou com novos embargos de declaração, em favor da manutenção do direito em relação aos grupos excluídos indevidamente.

Vale dizer que a USP também deverá permanecer recorrendo no sentido de insistir em reduzir a lista dos beneficiários, por mais que sua sustentação nesse sentido seja questionável e absolutamente perversa, considerando-se as irregularidades praticadas pela universidade, como no caso daquelas(es) que ingressaram por contratos precários quando a instituição deveria ter aberto concursos públicos de ingresso na carreira.

Não podemos deixar de dar destaque à nossa indignação e repúdio em relação ao fato de que, ao longo de todo o cumprimento de sentença, que se iniciou em 2019, a USP tenta reverter decisão transitada em julgado por meio processual inadequado, a fim de postergar o cumprimento da decisão (e ela efetivamente já interpôs novos embargos).

Ao mesmo tempo, tenta excluir do rol de beneficiárias(os) da ação docentes que, ao longo da história da USP, tiveram de preencher vagas precárias, por força da gestão da própria universidade. Em grande medida por conta dos esforços da categoria e da Adusp, a USP foi impelida a ir corrigindo tais situações a que deu causa – por exemplo, com programas de efetivação dessas(es) docentes.

Agora, porém, depois de todo esse tempo e esse histórico, a universidade lança mão do argumento da contratação precária em detrimento dos direitos das(os) docentes, ressuscitando problema que se pensava superado, como é o caso de professoras(es) contratadas(os) como precárias(os), bem como de contratadas(os) para museus e institutos especializados.

Causa ainda maior estranheza a defesa que a USP faz da exclusão daqueles(as) docentes que, a fim de ocupar cargo efetivo, regularizaram sua situação ao prestar concurso para doutor ou ao prestar concurso para professor titular para progredir na carreira.

Diante disso, vale perguntar se o entendimento da USP no caso é de que professoras(es) com contratos precários não deveriam ter recebido os devidos reajustes com base na legislação da URV, assim como todas(os) as(os) demais.

USP defende que novo cargo na carreira instaura vínculo funcional diferente

Para que a categoria possa ter elementos para avaliar a razoabilidade ou não da argumentação da USP no processo, segue trecho do recurso da universidade contrário à tese de inclusão das(os) docentes titulares e concursadas(os) após março de 1994:

“Seguem detalhadas as hipóteses, com os fundamentos para a reforma do r. decisum objurgado: i) Detentores de novo vínculo com a USP por aprovação em outro concurso e provimento em outro cargo, com direito eventual a mero pagamento retroativo. Os indivíduos que foram aprovados em concurso público e foram providos em novo cargo docente da Universidade de São Paulo, ingressaram em relação jurídica distinta daquela em que se assentou a pretensão da ação coletiva ordinária. Cumpre observar que, quanto ao quadro docente, a evolução na carreira universitária depende da aprovação em concursos públicos específicos. A carreira docente era à data dos fatos (e ainda é), estratificada em cargos distintos de Professor Doutor e de Professor Titular, repita-se, ambos acessíveis somente por meio de concurso público. Ou seja, um docente investido no cargo de Professor Doutor após aprovação em concurso público, somente poderá passar a ocupar o cargo de Professor Titular se tiver obtido o título acadêmico de Livre-Docente e se prestar e for aprovado em um novo concurso de provas e títulos específico para este último cargo, inexistindo, portanto, progressão funcional interna do cargo de Professor Doutor para o de Professor Titular.

Verifica-se que os docentes do grupo listado às fls. 408/435, no decorrer do tempo desde a época da conversão dos vencimentos em URV até o presente, prestaram concurso público e foram investidos em cargos de Professor Doutor e/ou Professor Titular. Ambos os cargos (Professor Doutor e Professor Titular) são de provimento originário e, nessa conformidade, ambos são de ingresso, pois em ambos a participação de candidatos estranhos aos quadros da ora Apelante é plenamente facultada, como se pode verificar nas disposições de seu Regimento Geral, artigo 121 e seguintes. Bem esclarecendo, qualquer candidato que possua os requisitos mínimos exigidos pelas normas estatutárias e regimentais da Universidade, pode se inscrever em concurso para Professor Doutor e Professor Titular, se e quando instaurado por alguma das denominadas Unidades universitárias (as faculdades, escolas, institutos etc, que integram a Autarquia). Não há, pois, necessidade de que o candidato seja anteriormente vinculado à USP.

Denota-se, assim, inexistir, no âmbito da Universidade, qualquer espécie de provimento ‘derivado’ de cargo docente: como dito, tanto o de Professor Doutor quanto o de Professor Titular são cargos que podem ser providos por candidatos estranhos ao quadro funcional docente ou por candidatos já vinculados à Apelante (e em tal situação aproveitando as vantagens pessoais anteriormente adquiridas, apenas). Como não há provimento ‘derivado’ nesta Universidade, o concurso por ela realizado, independentemente da Unidade universitária que o realize, é sempre de ingresso, promovendo a inauguração de nova relação jurídica, ainda que, eventualmente, sem solução de continuidade.

Certo que o docente ‘carrega’ o tempo de serviço e se mantém sob regência do mesmo regime previdenciário em que já estava inserido. Porém, a garantia de preservação de direitos de ordem previdenciária e pessoal, como contagem de tempo para fins de adicionais de remuneração, não significa que não ocorre o ingresso em relação jurídica com vínculo diverso. Ainda que com a mesma pessoa jurídica de Direito Público, há exoneração de um cargo e investidura em outro, inaugurando-se vínculo funcional distinto.

Ressalte-se que, com a investidura em novo cargo, a nova relação jurídica possui nova base remuneratória. É outro cargo, com outro salário. Não há que se falar, portanto, em direito ao reajuste do salário de 1993/1994, pois este deixou de existir com a aprovação em outro concurso e investidura em novo cargo. Assim, o encerramento da relação jurídica anterior e de todas as prestações bilaterais dela decorrentes tem dois efeitos inequívocos no caso em tela: i) deixa de existir o pagamento do salário em que pautada a discussão sobre diferenças na conversão em URV, não havendo também, por lógica, obrigação de fazer para aplicação de índice para correção da diferença em salário que não mais é pago; ii) passa a fluir o prazo prescricional para o exercício das pretensões eventualmente decorrentes daquela relação extinta. Portanto, para todos os indivíduos que passaram a desfrutar novo vínculo funcional com a Universidade, não há obrigação de fazer a implementar.”

É preciso obter uma solução definitiva para a questão

Resta saber em que medida essa argumentação da Procuradoria-Geral da universidade (PG-USP), que se mostra antagônica a outras assumidas em determinados momentos (como as posições defendidas pela USP e relatadas em reportagem de 2020 do Informativo Adusp Online), conta com o respaldo da atual administração.

Há tempos a Adusp tem se empenhado em solicitar audiência à Reitoria para tratar desse e de outros temas, sem lograr qualquer resposta. A entidade continuará a insistir para que haja diálogo a fim de mitigar a morosidade judicial e de favorecer entendimentos entre a entidade sindical e a Reitoria que permitam superar controvérsias para que se efetive o direito reconhecido no processo para todas(os) que já eram docentes em 1994 e estavam filiadas(os) à Adusp em janeiro de 2013.

Neste ínterim, a Adusp e a PG-USP iniciaram interlocução na tentativa de dar efetividade e celeridade ao cumprimento da decisão.

Portanto, é fundamental que a Reitoria aceite dialogar, para que a execução da sentença seja destravada e, assim, seja reparado o erro cometido pela USP ao executar a conversão de moedas em 1994, que infligiu perdas financeiras ao corpo funcional da universidade, conforme devidamente reconhecido pelo TJ-SP e pelo STJ.

EXPRESSO ADUSP


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