Medidas tomadas pelo governo estadual de São Paulo colocam em risco iminente o patrimônio científico, material e imaterial produzido pelo sistema público de pesquisa, aponta juíza da 2ª Vara da Fazenda Pública, amparada na argumentação do Ministério Público. “O imbróglio decorrente da extinção das instituições efetivamente representa um retrocesso para sociedade, o meio ambiente e a ciência, e sua solução vai depender de novas decisões judiciais que atendam aos aspectos mais estruturais”, diz o presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental

A juíza Lais Helena Bresser Lang, da 2ª Vara da Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), concedeu liminar na última sexta-feira (6/8) na qual suspende os efeitos do Decreto 65.274/2020, publicado pelo governo estadual em outubro do ano passado.
 
O decreto altera o Sistema Estadual de Florestas (Sieflor) e aprofunda o desmonte de três institutos de pesquisa paulistas: o Florestal (IF), o Geológico e o de Botânica. A ação civil pública que pediu a liminar foi movida pelo Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam), tendo como amicus curiae a Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC).
 
“A proposta de extinção dos institutos é absurda e padeceu de falta de justificativa e planejamento. Agora estamos colhendo as consequências”, disse ao Informativo Adusp o presidente do Proam, Carlos Bocuhy, ressaltando que ainda há muitas lacunas não solucionadas.
 
Em sua decisão, a juíza lembra que o IF foi extinto pela Lei 17.293/2020, resultante do PL 529, aprovado por pequena margem na Assembleia Legislativa e que iniciou uma espécie de “reforma administrativa” no Estado, extinguindo órgãos públicos e majorando alíquotas do ICMS e de contribuição ao Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público (Iamspe), entre outras medidas.
 
De acordo com a lei, as atribuições de pesquisa do IF passariam a ser exercidas por uma nova unidade administrativa, enquanto as demais atividades seriam assumidas pela Fundação Florestal e as funções administrativas caberiam à Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente (SIMA).
 
A “nova unidade administrativa” é o Instituto de Pesquisas Ambientais (IPA), criado por decreto publicado pelo governo Doria em junho deste ano e resultado da fusão dos institutos Geológico e de Botânica e da transferência das atividades de pesquisa do IF. Em outro procedimento judicial, o Proam e a APqC ingressaram com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no TJ-SP em relação aos efeitos dessa medida.

“Ilegalidade do decreto é patente”, sustenta MP-SP

De acordo com a magistrada, o decreto que altera as normas de funcionamento do Sieflor, publicado poucos dias depois da promulgação da Lei 17.293, em outubro do ano passado, “delegou determinadas atribuições a órgãos públicos da Administração, que não detêm a devida competência legal, como a execução do Plano de Produção Sustentada (PPS) à Fundação Florestal, que não possui atribuição legal para gerir as áreas de pesquisa ou executar atividade de pesquisa; transferiu atividades/unidades de pesquisa à Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente (SIMA), que não possui atribuição específica para a gestão das pesquisas envolvendo o Sieflor”.
 
A juíza Lais Lang cita a argumentação apresentada na ação pelo Ministério Público (MP-SP), que ressalta a necessidade de “compreender a magnitude da importância do Sieflor como um sistema que, gerido pelo Instituto Florestal, produziu vasto e relevantíssimo patrimônio científico vinculado à questão florestal”.
 
“A ilegalidade do decreto ora questionado que extrapolou os limites da lei  17.293/2020 é patente”, afirma o MP-SP, sustentando que, “em virtude da ausência de competência legal tanto da SIMA como da Fundação Florestal para a gerência da pesquisa científica do programa Sieflor, existe, de fato, o risco iminente de perda de todo o patrimônio científico, material e imaterial, produzido no âmbito desse sistema”.
 
O texto que criou o IPA “não revogou o decreto aqui impugnado”, prossegue o MP-SP. “Assim, persiste a ilegalidade atinente à atribuição da gestão da pesquisa científica do Sieflor e do PPS à SIMA e à Fundação Florestal, que não possuem competência legal para tanto, o que, somado à ausência de expertise científica desses órgãos para gerir tal sistema, pode levar ao comprometimento das atividades de pesquisas desta valiosa política pública consolidada.”
 
Na decisão, a juíza determina que o Estado apresente, no prazo de 48 horas, “os nomes, e designação no Diário Oficial, dos gestores de todas as áreas que foram transferidas para a Fundação Florestal, por meio do Decreto 65.274, de 26 de outubro de 2020, sob pena de que referidas áreas sejam tuteladas pelo Instituto de Pesquisas Ambientais, novo instituto que incorporou os pesquisadores dos Institutos Florestal, Botânico e Geológico”.
 
“A liminar da juíza acatou toda a argumentação do Proam, assim como a do MP-SP, o que é reafirmado na sentença. Esperávamos a determinação de que cessasse o processo transitório até que os estudos comprovassem a necessidade e condições para se criar um novo instituto, o que a juíza atendeu de forma parcial, entendendo de forma correta que não se poderia deixá-lo à deriva como está, e determinando a reestruturação imediata por meio de gestores”, afirma Bocuhy.
 
Na sua avaliação, eventuais novas contratações para a nomeação de gestores “praticamente detonam a motivação da lei, que era uma falaciosa economia de recursos”. “O pior pode acontecer se houver a indicação de gestores sem experiência ou competência para essa administração”, considera.
 
“Este imbróglio decorrente da extinção das instituições efetivamente representa um retrocesso para sociedade, o meio ambiente e a ciência, e sua solução vai depender de novas decisões judiciais que atendam aos aspetos mais estruturais”, diz o presidente do Proam. A totalidade dos pleitos, completa, está na ação civil pública e na ADI, “cujos argumentos foram acolhidos integralmente pelo MP-SP”.

Avança projeto de privatização de parques urbanos

A política de privatização do governo Doria segue avançando em alta velocidade. No dia 31/7, o Diário Oficial do Estado publicou ata da reunião do Conselho Diretor do Programa Estadual de Desestatização, realizada dois dias antes. Participaram da reunião, entre outros, o vice-governador Rodrigo Garcia (PSDB), presidente do Conselho Gestor do Programa de Parcerias Público-Privadas; o secretário da Fazenda, Henrique Meirelles; o titular da SIMA, Marcos Rodrigues Penido; e a indefectível Patrícia Ellen da Silva, secretária de Desenvolvimento Econômico.
 
O colegiado aprovou a “modelagem preliminar do projeto” de concessão dos parques Villa-Lobos, Candido Portinari e Doutor Fernando Costa (Água Branca), todos na capital. As premissas do “modelo referencial” para o projeto incluem “liberdade de operação e exploração dos ativos à concessionária”, “pagamento de outorga fixa e variável” e “manutenção de entrada gratuita”. Também foi autorizada “a realização das etapas de audiência e consulta pública às minutas do Edital, contrato e demais anexos”.
 
Outro tópico aprovado pelos conselheiros foram as “premissas preliminares da modelagem” da “concessão patrocinada do Trecho I do Sistema de Trem Intercidades e da Linha 7-Rubi da CPTM [Companhia Paulista de Trens Metropolitanos]”.
 
O projeto inclui “operação, manutenção e obras, para melhoria da qualidade dos serviços prestados da Linha 7-Rubi da CPTM, e construção e operação do ‘Trem Intercidades’”, que em seu eixo norte prevê um trem expresso São Paulo-Jundiaí-Campinas, além de um intermetropolitano com paradas em outros municípios, como Valinhos, Vinhedo e Campo Limpo Paulista.
 

EXPRESSO ADUSP


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