Defesa da Universidade
CPI das Universidades surpreende e começa a discutir relatório final nesta terça-feira (15/10)
Convocação para apresentação do texto da relatora, deputada Valeria Bolsonaro (PSL), foi feita sem nenhuma negociação ou comunicação prévia, o que foge à rotina da Alesp. Oposicionistas preveem relatório com questionamento à autonomia de gestão — e devem apresentar voto em separado para inclusão de outros temas
Alesp |
Relatório de Valeria Bolsonaro (PSL) deve questionar autonomia das universidades |
O deputado Wellington Moura (Republicanos), presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleía Legislativa de São Paulo (Alesp) que investiga “irregularidades na gestão” das universidades públicas estaduais, convocou reunião para esta terça-feira (15/10) com a finalidade de discutir o relatório final da comissão. A primeira convocação é para as 11h00, e há outras três previstas para 11h30min, 14h00 e 14h30min, o que busca assegurar a garantia de quórum para o início das deliberações.
A convocação foi recebida com estranheza pela minoria oposicionista na CPI, entre outras razões porque foi publicada no Diário Oficial do Estado no sábado (12/10). Além disso, a praxe na Casa é que a apresentação de relatórios não ocorra sem comunicação ou negociação prévias, o que não foi o caso. Os representantes do PT na comissão — a titular, deputada Professora Bebel, e o suplente, Paulo Fiorilo — preparam apresentação de voto em separado e estudam outras estratégias para questionar o relatório.
A maioria dos nove integrantes da comissão é de partidos de direita e de extrema-direita. O presidente, Wellington Moura, é vice-líder do governo na Alesp e autor do requerimento de criação da CPI. A vice-presidência coube a Carla Morando, líder do PSDB na Casa. A deputada faltou a várias sessões depois que seu marido, Orlando Morando (PSDB), prefeito de São Bernardo do Campo, foi indiciado no início de setembro pela Polícia Federal na Operação Prato Feito, que investiga fraudes em licitações em cerca de 30 prefeituras do Estado.
A relatora é a deputada Valeria Bolsonaro (PSL). O sobrenome vem do marido, cujo avô era tio-avô de Jair Bolsonaro. Na CPI, Valeria — professora de Biologia da rede municipal de Campinas — é uma das parlamentares mais dedicadas a questionar a autonomia administrativa e de gestão das universidades estaduais. Numa das sessões, em agosto, defendeu que “é preciso rever essa autonomia para que ela não se torne uma soberania das universidades”. Carlão Pignatari (PSDB), que é líder do governo na Alesp e não integra a CPI, compareceu a uma das reuniões para dizer que as universidades devem manter a “autonomia pedagógica”, mas que é preciso “abrir a discussão” quanto aos aspectos financeiros e de gestão.
Valeria Bolsonaro também perguntou repetidas vezes a reitores e pró-reitores da USP, Unesp e Unicamp quanto aos critérios para a realização de pesquisas, criticando o número de trabalhos realizados sobre aborto, por exemplo. Numa entrevista publicada pela Folha de S. Paulo em março, afirmou: “Infelizmente, esse boom de universidades que tivemos criou fábricas de militantes. Estou cansada de ver a fortuna que se gasta em pesquisas que não são usadas para absolutamente nada”.
O questionamento à autonomia e ao rol de pesquisas realizadas pelas universidades certamente ocupará um lugar importante no seu relatório. Questões como a insuficiência financeira e a necessidade de aumento da destinação de recursos às universidades, embora tenham sido constantemente abordadas pelos reitores e pro-reitores, parecem não ter sensibilizado a bancada governista.
De acordo com o Regimento Interno, depois de aprovados, os relatórios das CPIs são encaminhados, na Alesp, à Mesa Diretora, à comissão permanente “que tenha maior pertinência com a matéria” e à Comissão de Fiscalização e Controle, além do Ministério Público, Procuradoria-Geral do Estado, Defensoria Pública, Poder Executivo e Tribunal de Contas do Estado.
Deputados enxergam “predomínio da esquerda” e “caixa-preta” nas universidades
Embora o objeto da CPI, conforme o requerimento que a criou, seja “investigar irregularidades na gestão das universidades públicas no Estado, em especial quanto à utilização das verbas públicas repassadas a elas”, desde o início dos trabalhos ficou claro que uma parte de seus componentes pretendia dedicar-se à prática da perseguição ideológica. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo às vésperas da primeira sessão da CPI, em abril, o presidente Moura declarou: “Vamos analisar como as questões ideológicas estão implicando no orçamento. Eu percebo um predomínio da esquerda nas universidades. Infelizmente, muitos professores levam mais o tema ideológico do que o temático para a sala de aula”.
Entre as conclusões que a CPI poderia apresentar, Moura antevia a proposta de mudança na gestão, como a publicação de um decreto legislativo determinando que a lista tríplice para a Reitoria poderia ser formada a partir de “um nome indicado pelo governo, outro pelos deputados e um terceiro pela universidades”. Na mesma reportagem do Estadão, a deputada Carla Morando afirmou que as universidades públicas são “uma caixa-preta” e “dominadas pela esquerda”.
A CPI das Universidades foi viabilizada por uma manobra da base de apoio ao governador João Doria (PSDB). Assessores de parlamentares permaneceram na fila do protocolo ao longo de mais de sessenta horas — desde a noite de sexta-feira (15/3) até a manhã da segunda-feira (18/3) — para garantir que os seus requerimentos de criação de comissões de inquérito fossem os primeiros a ser registrados. Apenas cinco CPIs podem funcionar simultaneamente na Casa, e a prioridade é pela ordem em que os pedidos dão entrada no protocolo.
A manobra permitiu que fossem criadas comissões para se debruçar sobre temas como serviços de táxi aéreo e venda de animais em pet shops, deixando de fora da pauta questões sensíveis para o governo estadual. Entre elas, a investigação da Dersa — empresa do governo paulista cujo ex-diretor Paulo Vieira de Souza (conhecido como Paulo Preto) está preso desde fevereiro — e de possíveis atos de improbidade e ilegalidades na concessão de benefícios fiscais que teriam acarretado renúncia de receitas pelo Estado num total estimado em R$ 115,5 bilhões nos últimos dez anos.
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