Defesa da Universidade
Decreto do governo submete a escolha dos reitores das universidades federais a órgãos de investigação
Nomeação de pró-reitores caberá ao presidente da República e seus ministros, enquanto a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e a Controladoria-Geral da União (CGU) poderão investigar a “vida pregressa” de indicados para ocupar cargos em comissão ou função de confiança. Andes-SN diz que o texto “afronta a autonomia universitária” e estuda formas de questioná-lo na Justiça
Um decreto publicado no Diário Oficial da União no dia 15/5 altera diversas atribuições do governo federal quanto aos “atos de nomeação e de designação para cargos em comissão e funções de confiança de competência originária do presidente da República”. Entre diversas alterações, o decreto institui o Sistema Integrado de Nomeações e Consultas (Sinc).
De acordo com o texto, que passa a ter vigência a partir de 25/6, o Sinc “tem por finalidade o tratamento e a disponibilização de informações para o provimento de cargo em comissão ou de função de confiança cuja indicação tenha sido encaminhada à Casa Civil da Presidência da República”. No artigo 11, o decreto diz que o Sinc deverá “possibilitar a verificação da existência de óbice ao provimento de cargo em comissão ou de função de confiança”.
O artigo 18 determina que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e a Controladoria-Geral da União (CGU) vão disponibizar no novo sistema, “para avaliação da Subchefia para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República, informações acerca da vida pregressa do indicado para ocupar cargo em comissão ou função de confiança”.
Não ficam claros no decreto quais são os aspectos que podem ser investigados nem o que poderia ser considerado um “óbice” para as indicações.
Para o Andes, decreto “é uma afronta à autonomia universitária”
O decreto cria uma etapa a mais na escolha dos dirigentes das instituições federais de ensino superior. Até aqui, os reitores das universidades são escolhidos a partir de uma lista tríplice encaminhada à Presidência da República com os nomes mais votados em consulta na comunidade universitária. Tradicionalmente, o candidato mais votado é o referendado. Agora, a lista deve passar pelo crivo da Secretaria de Governo – ocupada no momento pelo general Santos Cruz – antes de chegar ao presidente.
Mesmo a indicação de nomes para ocupar outros cargos de direção pode ser barrada, dependendo da avaliação da “vida pregressa” ou da “conveniência e oportunidade administrativa quanto à liberação ou não das indicações submetidas à sua avaliação”, conforme diz o artigo 22.
O Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN) emitiu uma análise jurídica preliminar a respeito do decreto. Para a entidade, especificamente em relação às instituições federais de ensino superior, um dos principais problemas é retirar dos reitores a competência de nomear e exonerar ocupantes de cargos como pró-reitores, diretores de centro, de campi e outros, bem como de dar provimento a cargos públicos por concurso público. Essas atribuições passam a ser do presidente da República e/ou dos ministros da Casa Civil e da Educação.
Para o Andes-SN, o decreto é inconstitucional por violar a autonomia universitária, expressa no artigo 207 da Carta. Também são desrespeitados dispositivos de outras leis, diz a entidade, como a 5.540 – que determina que os diretores de unidades universitárias federais são nomeados pelo reitor.
“Esse decreto é uma total afronta à autonomia universitária. Ele abre um precedente que remonta à época da ditadura e quebra o preceito do republicanismo dentro das universidades”, disse ao Informativo Adusp Eblin Joseph Farage, professora da Escola de Serviço Social da Universidade Federal Fluminense (UFF) e secretária-geral do Andes-SN. De acordo com a Eblin, a entidade está em contato com outras organizações e vai questionar o decreto judicialmente.
Inep muda de presidente – de novo
O Ministério da Educação (MEC) anunciou nesta sexta-feira (17/5) o nome de Alexandre Ribeiro Pereira Lopes como novo presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), responsável pelo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).
Lopes é servidor público de carreira desde 1999 e vinha atuando como diretor legislativo na secretaria-executiva da Casa Civil da Presidência da República, onde o atual ministro Abraham Weintraub também trabalhou antes de assumir o MEC.
O novo presidente será o quarto ocupante do posto neste ano e o terceiro indicado pelo governo Bolsonaro. A primeira demitida, Maria Inês Fini, estava na função desde 2016, nomeada por Michel Temer, e foi exonerada no dia 14/1. Maria Inês foi substituída por Marcus Vinícius Rodrigues, que só durou dois meses no cargo e foi demitido pelo então ministro Ricardo Vélez Rodríguez.
Na sequência assumiu o delegado da Polícia Federal Elmer Coelho Vicenzi, que não chegou a vinte dias na função: entrou em 29/4 e pediu demissão em 16/5. De acordo com reportagens publicadas na imprensa, o motivo da saída teria sido uma disputa com a procuradora-chefe do Inep, Carolina Scherer Bicca, a respeito da transparência de dados sobre os estudantes do ensino básico e superior. O ex-presidente seria favorável ao uso dessas informações, enquanto a procuradora é contrária.
A queda de Vicenzi é a primeira no alto escalão da gestão de Weintraub, à frente do MEC há pouco mais de um mês. Desde o início do governo Bolsonaro, no entanto, muitos ocupantes de cargos de comando no ministério e no Inep já foram trocados, evidenciando conflitos internos entre grupos do governo.
O Enem é um dos alvos das guerras culturais movidas pelo governo. O próprio Bolsonaro já disse que a prova servia para “doutrinação marxista” e manifestou seu desejo de ter acesso prévio ao conteúdo dos exames, o que é ilegal.
Em editoriais, jornais atacam atuação do governo na educação
Nesta sexta (17/5), os editoriais dos principais jornais paulistas dirigem ataques a Bolsonaro. A Folha de S. Paulo diz que “o obscurantismo agressivo do governo Jair Bolsonaro (PSL) converteu o crucial debate sobre o financiamento do ensino superior público, já tardio no país, em um confronto de bandeiras ideológicas”.
“Não se duvide das deficiências do aprendizado nacional, tampouco do oportunismo de forças oposicionistas que aproveitaram o momento inclusive para atacar a reforma da Previdência Social. Entretanto as manifestações [do dia 15] se pautaram por uma causa pertinente —o governo que mal começou representa, sim, ameaça à educação”, afirma o diário.
Já O Estado de S. Paulo cita a frase de Bolsonaro a respeito dos cidadãos que participaram dos atos do dia 15: “‘São uns idiotas úteis’, disse o presidente ao se referir aos manifestantes que foram às ruas na quarta-feira para protestar contra o contingenciamento de verbas na área de educação. No mesmo dia, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, destratou deputados que o haviam convocado para uma sabatina na Câmara, preferindo a pesporrência ao diálogo. Tudo isso pode ter feito a alegria da seita bolsonarista no Twitter, mas o fato é que o governo começa a encarar nas ruas, precocemente, as mesmas dificuldades que já enfrenta há algum tempo no Congresso – situação que, como mostra a história recente do País, ninguém sabe como começa, mas todos sabem como termina”.
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