Defesa da Universidade
É preciso dizer não
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Logo terá início mais um ano letivo, e gostaríamos de acreditar que 2013 será melhor que o anterior. Afinal, 2012 não foi fácil: o número de tarefas aumentou, a cobrança por resultados não deu trégua, o processo de progressão horizontal deixou graves sequelas. No final do ano, a Reitoria anunciou a concessão do prêmio de excelência que, na verdade, premia o “bom comportamento” das categorias: dado que foi mais um ano sem greves, docentes e funcionários “fizeram por merecer”… E, claro, uma vez mais a USP subiu nos rankings…
Em dezembro o reitor informou às entidades que os processos administrativos movidos contra estudantes e funcionários participantes da ocupação do prédio da Reitoria (em novembro de 2011) estavam perto do fim — desta vez, não haveria “eliminação” de estudantes! Vários seriam absolvidos, outros repreendidos ou suspensos por 5 a 15 dias, o que veio a se confirmar em janeiro de 2013. As penalidades aplicadas aos funcionários envolvidos são semelhantes, mas se revestem de maior gravidade, pois além do desconto salarial permanecerá o registro nos prontuários.
O relativo alívio durou pouco. O novo ano letivo principia sob o impacto de uma grave notícia: a denúncia do Ministério Público Estadual (MPE) contra setenta e duas pessoas: alunos e funcionários da USP (e alguns manifestantes de fora), todos acusados de crimes que podem resultar em penas de oito anos de prisão ou mais (p. 2).
Setenta e dois denunciados! Teria a Reitoria optado por “passar o bastão” ao MPE, evitando acentuar o desgaste ocorrido na “eliminação” de seis estudantes em 2011? (Abuso este que o Judiciário coibiu, ao conceder a reintegração de dois deles.)
Contudo, seja qual for o aparato estatal responsável, está clara a persistente criminalização do exercício da política e dos movimentos sociais dentro e fora da Universidade. Tendência policialesca que, vale lembrar, levou o Gabinete da Reitoria a montar, à margem da lei, um esquema de espionagem interna, empregado contra os movimentos que atuam nos campi da instituição — curiosamente, o MPE não se interessou por este assunto.
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A Universidade pública, reduto do pensamento crítico, da rebeldia intelectual, da liberdade cultural, da cidadania política, vê-se cada vez mais reduzida a uma espantosa condição de submissão. As forças políticas dominantes na administração precisam domesticar a Universidade, como condição sine qua non para abrir caminho a valores e práticas mercantis que vêm sendo implantados no ensino superior brasileiro, inexoravelmente, desde os anos 1990.
O projeto em curso é mais amplo e pretende envolver todas as instituições públicas de ensino superior. Trata-se de subordinar a Universidade aos interesses do capital, o que requer transformar cientistas em empresários (ou “empreendedores”). Tenta-se “quebrar a espinha” do corpo docente, seja por meio de cooptação, seja por meio do controle exercido por uma sequência infindável de “avaliações” e certificações.
A cientometria positivista adotada e imposta pela Capes — seus rankings, contagens, Qualis, avaliações — encontrou terreno fértil na vocação meritocrática e punitiva das burocracias que controlam as maiores universidades brasileiras e agências de fomento. A USP identificou-se com o projeto e tornou-se um de seus motores no Brasil.
Reduziram-se drasticamente os prazos da pós-graduação; as publicações tornaram-se o objetivo primeiro da pesquisa; a graduação e a docência foram rebaixadas a atividades menores. Extensão tornou-se sinônimo de venda de serviços por fundações privadas ditas “de apoio”: cursos pagos, consultorias, projetos de encomenda. Docentes passaram a ser divididos em “produtivos” e “improdutivos”, como se a Universidade fosse mero ramo industrial.
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Encerrada a primeira rodada de avaliação da progressão horizontal, na qual inscreveram-se 2.380 colegas (49,95% do contingente total de MS3 e MS5!), ficou claro que as regras do jogo consolidam o viés produtivista da avaliação e sua função de instrumento de sedução e, ao mesmo tempo, de controle da força de trabalho.
Os mecanismos utilizados na primeira rodada da progressão horizontal atestam a inventividade dos avaliadores. Primeiro sacaram a “fração niveladora”; como não conseguiram sustentá-la, passaram a recorrer ao vale-tudo. São muitos os casos de injustiça; as insatisfações resultaram em manifestos nas unidades e em crises nos colegiados centrais. O caso do professor Ciro Correia (IGc), relatado à p. 3, comprova que várias CAS operam à revelia da Resolução 5.927 (que rege o processo e manda priorizar “a qualidade do conjunto das atividades do docente”) e valem-se arbitrariamente de comparações entre o candidato e seus pares!
A Universidade pública, capaz de produzir conhecimento livremente, sem as amarras impostas por interesses privados, é estratégica para um país que se pretenda democrático, soberano e socialmente justo. Se quisermos manter acesa a esperança de que Universidade rime com liberdade, com diversidade, com qualidade, vamos precisar dizer “não”. Em alto e bom som. Os docentes podem fazer a USP subir no ranking da combatividade. Talvez isso não renda prêmios individuais, mas certamente trará a todos um novo ânimo, no início de cada ano letivo. Ademais, isso fará jus à verdadeira essência da Universidade!
Informativo nº 357
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