Seminário sobre Direito reforça importância da ação política

Ouvida de docentes da Faculdade do Largo São Francisco, e que são juízes há muitos anos, a advertência, feita a propósito da escalada de intolerância policial e judicial promovida pela Reitoria da USP, causou impacto: “Estamos com a espada do Direito sobre todos nós. Até que ponto podemos acreditar no Direito? A ação política é que resolve e alimenta o diálogo democrático. Os que não estão sendo processados têm que agir politicamente em defesa dos processados. O contra-ataque é político, pela via da solidariedade”, destacou o professor Jorge Souto-Maior. “O Direito é repressor. Se [o reitor] Rodas se sentiu confortável, é porque é a linguagem dele”, expressou o professor Marcus Orione.

Realizado no auditório da História em 10/4, o seminário “Universidade Pública, Democracia e Estado de Direito” reuniu professores, estudantes e funcionários em um debate dos aspectos jurídicos e políticos dos acontecimentos que se desenrolam na USP desde o início da gestão Rodas, e particularmente após setembro de 2011, quando foi assinado convênio entre a Reitoria e a Secretaria de Segurança Pública (SSP-SP) que resultou na presença permanente e ostensiva da Polícia Militar na Cidade Universitária do Butantã.

“A diretoria da Adusp está sendo processada por algo que não falou, o que me parece mais impressionante”, disse Souto-Maior. Ele observou que, enquanto a Reitoria faz referência, em outros processos, a supostos danos ao patrimônio, deixa de lado questões de enorme relevância, como a denúncia da existência de um aparato de espionagem interna na USP: “Nós convivemos com um problema jurídico muito grave. A Universidade ainda não se manifestou sobre o relatório confidencial da tal Sala de Crise, de invasão das privacidades”.

Benesses

Também para Marcus Orione, não há como “depositar tanta fé” nas instituições judiciárias, “extremamente burocratizadas, extremamente enroladas em si mesmas”. Para ele, a maioria dos juízes age como “gerentes desse estado de coisas”, aliando-se ao grande capital e não aos trabalhadores.Como exemplo de que o Direito “vem servindo ao status quo, à manutenção das benesses, das diferenças de classe”, o docente citou o caso do funcionário Claudionor Brandão, diretor do Sintusp demitido pela Reitoria com base, entre outras alegações, por ter agido em favor dos funcionários terceirizados: “O argumento foi de que ele estava atuando fora dos parâmetros regulares da representação da sua categoria. Puxa vida! Um dirigente sindical não ter o direito de agir com solidariedade de classe? Ele foi processado administrativamente por isso e o Judiciário confirmou a [demissão por] justa causa dele”. Por isso, acredita, não há como “confiar no Judiciário para fazer uma contra-ofensiva”.

Ele repetiu pergunta feita em artigo publicado em 2011, em co-autoria com Souto-Maior e Paulo Arantes, a propósito do convênio com a SSP: “Por que a PM aqui, se esta universidade tem especialistas suficientes para dar respostas de segurança pública? A Reitoria jamais colocaria uma quantidade de especialistas em urbanismo, em assistência social, em direito, para trabalhar com o entorno”.

“Sem lastro”

No debate, a pós-graduanda Maria Fernanda apontou as “ações desmobilizadoras” levadas a cabo pela Reitoria — como a concessão de mil bolsas de graduação para estudos no exterior — que se valem do momento de “tranquilidade financeira” da USP e afetam as três categorias, e destacou a necessidade de se “pensar estratégias políticas para enfrentar o momento”.

O professor Ciro Correia (IGc) argumentou que os defensores da universalização do ensino e de uma Universidade que não seja da oligarquia vivem tempos difíceis, que suscitam a questão de como sobreviver mantendo um mínimo de organização e consciência. “Muitas vezes, quando a gente procura discutir a melhor tática e a melhor estratégia de luta, a responsabilidade com a qual a gente precisa dosar nossas ações em relação à capacidade de reação dos nossos adversários, somos tachados de conservadores, de medrosos, de estar do lado da direita — quando no limite estamos fazendo o contrário”, disse o docente, ex-presidente do Andes-SN.

“É preciso que todas as forças políticas saibam avaliar as dificuldades do momento, para saber que eventualmente, contra a nossa vontade, na hora em que você ocupar a Reitoria sem o devido lastro social, sem o devido respaldo da categoria, você vai ser sim vítima de uma ação agressiva e injusta, mas que dificilmente a gente vai conseguir reverter. Esta tem sido a principal dificuldade de fazer luta dentro de cada categoria e conjunta das categorias, porque não tem havido um diálogo respeitoso sobre as dificuldades e os limites da nossa ação. É isso que espero que a gente consiga aos poucos reverter”, completou Ciro.

O professor Luiz Martins (ECA) considerou acertada a avaliação dos expositores e alertou para o clima de medo que se instaura diante do modo de agir fascista com o qual se tratam os conflitos. A professora Zilda Iokoi (FFLCH) denunciou a política higienista aplicada pela administração e ponderou que diante das dificuldades que a conjuntura nos impõe é oportuno refletir sobre recuos estratégicos no sentido de preservar nossas entidades e lutas.

“Geopolítica”

Magno de Carvalho, do Sintusp, informou que o processo contra os dirigentes do sindicato está se agravando. Propôs a unificação de todos os setores do movimento: “Nunca foi tão necessário a gente se unir. Por trás do reitor estão Alckmin, Serra. É preciso achar um denominador comum”. O aluno Paulo Fluxus, das Artes Plásticas, criticou o que chamou de “reestruturação geopolítica física” da Universidade, cujo maior exemplo seriam as mudanças planejadas para a área hoje ocupada pela ECA.

O professor Waldir Beividas (FFLCH) lamentou o fato de que colegas de departamento tenham se negado a liberar estudantes para que assistissem a uma palestra sobre democracia, como indicador do ambiente carregado que se criou na USP. “O fascismo se baseava na lei”, pontuou a professora Dóris Cavalari (FFLCH), antes de indagar aos colegas da mesa: “Os professores não podem também processar a Reitoria por calúnia?” Ela se referiu ainda ao elo entre a gestão Rodas e o governo estadual: “O PSDB é uma Ditadura, está lá há vinte anos”.

Ao encerrar o debate, o professor César Minto, vice-presidente da Adusp, enfatizou a importância da reflexão coletiva: “A Adusp tem pautado a sua ação na discussão e deliberação coletivas. Semanalmente temos reunião da diretoria ampliada, a gente avalia os passos que dá”. Ele explicou, ainda, que o foco não são as ações judiciais propriamente ditas, mas a luta política: “Sempre acreditamos nessa forma de atuar, de tentar responder coletivamente. Temos algumas diferenças de leituras e de táticas, momentâneas, mas buscamos nos espaços coletivos, como o Fórum das Seis, tratar isso pelo mínimo comum: aquilo que nos unifica, que permite encetar uma luta coletiva”.

 

Informativo nº 343

EXPRESSO ADUSP


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