Inclusão e pertencimento
Proposta de regulamentação do programa de educação infantil da USP mantém exclusão de filhos(as) de pós-doutorandos(as) das creches; documento não fala em contratações para recompor quadro de pessoal
Encerra-se nesta sexta-feira (18 de abril) o prazo concedido pela Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP) para o envio de sugestões por escrito para a Proposta de Regulamento do Programa de Educação Infantil da USP. O texto final, cujo objetivo é estabelecer diretrizes para o funcionamento das unidades, será submetido ao Conselho de Inclusão e Pertencimento (CoIP) no próximo dia 8 de maio. A minuta foi elaborada pelas equipes de Educação Infantil da USP, com supervisão da Rede de Educação Básica da USP.
O texto contém um total de 52 artigos, divididos em oito títulos, que tratam de questões como objetivos das unidades (atualmente são cinco, duas em São Paulo e as demais em Piracicaba, Ribeirão Preto e São Carlos), organização, fóruns colegiados e quadro de profissionais.
Um dos principais problemas identificados por representantes da comunidade uspiana se apresenta logo no artigo 6º, que determina que “as unidades de Educação Infantil da USP são destinadas aos filhos(as) e dependentes legais de servidoras e servidores docentes e técnico-administrativos e estudantes de graduação, pós-graduação stricto sensu desta Universidade e comunidade externa para as unidades que apresentarem vagas remanescentes do processo seletivo”.
Foram excluídos(as), portanto, os(as) pós-doutorandos(as), que em anos anteriores podiam concorrer às vagas para suas crianças.
“Isso prejudica um contingente de pesquisadores e pesquisadoras que vêm para a USP, eventualmente com sua família, e que deveriam ter acesso garantido nos processos seletivos”, afirma a professora Annie Schmaltz Hsiou, docente da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) e 1ª secretária da Adusp. De acordo com o Anuário Estatístico da USP, em 2023 havia 4.099 pós-doutorandos(as) na universidade, sendo 2.083 homens e 2.016 mulheres.
Integrantes do movimento Parent in Science, Camila Infanger Almeida, aluna de doutorado do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), e Ana Carla Batissoco, pós-doutoranda da Faculdade de Medicina (FMUSP), relatam que chegaram ao seu conhecimento pelo menos “dois casos de mães pós-doutorandas, afiliadas a diferentes unidades da USP, que tiveram negado o acesso a vagas na creche e estão impossibilitadas de seguir suas pesquisas com seus arranjos pessoais atuais de conciliação de maternidade e atribuições acadêmicas”.
“Solicitamos que ações sejam tomadas, por parte da PRIP e da Reitoria da USP, para que tratamento similar a estudantes e docentes seja oferecido às mães pós-doutorandas e que o acesso às creches da universidade seja viabilizado, a fim de que sejam promovidas condições adequadas de continuidade das pesquisas existentes conduzidas por essas mães, sem prejuízo à sua vida pessoal”, evitando-se assim a punição da maternidade por parte da instituição, reivindicam as representantes em artigo enviado ao Informativo Adusp Online (leia a íntegra abaixo).
A reportagem entrou em contato com a PRIP, por meio da Assessoria de Imprensa da Reitoria, para questionar por que os(as) pós-doutorandos(as) foram excluídos(as) na proposta de regulamento, mas a pró-reitoria não se manifestou.
Papel das famílias nos fóruns colegiados não está claro, diz docente
A professora Annie Schmaltz Hsiou aponta outros problemas na proposta. “Senti falta em todo o documento de incluir as questões de gênero, raça e diversidade” diz.
No artigo 10º, que trata dos objetivos específicos do programa de educação infantil, a professora afirma que “é preciso exigir que o tripé da universidade e suas atividades ligadas a ensino, pesquisa e extensão seja explicitado no regimento para valorizar a educação infantil nas creches e pré-escolas da USP”.
A docente também levanta questionamentos a respeito de temas que considera pouco claros no documento, como a concepção do programa de formação continuada mensal, a relação das unidades com os(as) estagiários(as) e o papel das famílias nos fóruns colegiados.
Uma questão muito importante, avalia Annie, é o número de novas vagas oferecidas nos processos seletivos, que de acordo com o artigo 21 do texto “corresponderá à capacidade de cada unidade de Educação Infantil, tendo em vista seu espaço físico e a quantidade de profissionais dos diversos setores aptos a exercerem suas funções nos quadros de servidores de cada instituição, em total consonância com as disposições legais brasileiras vigentes”.
“Como vamos conseguir fazer essa razão adulto-criança se faltam professores e professoras nas creches? Não há contratações, e as saídas nos planos de demissão voluntária [de 2015 e 2016] não foram repostas”, questiona a professora. “O documento não fala nada sobre a contratação de pessoal, seja de corpo docente ou funcional, além de profissionais de psicologia, enfermagem ou nutrição.”
Leia a íntegra da manifestação das representantes do Parent in Science
Nós, do Parent in Science, gostaríamos de nos posicionar em relação à situação de vulnerabilidade que pesquisadoras pós-doutorandas enfrentam quanto à inacessibilidade a serviços de assistência estudantil, como restaurantes universitários, ônibus do câmpus (BUSP), Hospital Universitário e, em especial, o sistema de creches da universidade.
A vulnerabilidade de mães pós-doutorandas pode ser comprovada por índices de impactos similares aos sofridos por docentes, como mostram estudos feitos no período da pandemia, segundo dados levantados pelo movimento PiS (páginas 8 e 9).
Em nome da promoção da equidade a mães acadêmicas, nosso movimento repudia a exclusão de mães pós-doutorandas de editais de vagas em creches da universidade.
Em relação ao contexto da USP, gostaríamos de pontuar o endurecimento do tratamento dado às mães pós-doutorandas, considerando a resolução vigente em 2022, a qual reservava o contingente de 15% das vagas a filhos(as) de pós-doutorandos(as), e a atual, CoPI 8689, de setembro de 2024, que exclui por completo filhos(as) de pós-doutorandos(as) da elegibilidade do edital.
A Resolução atual prevê que pós-doutorandos(as) possam arcar com atribuições comparáveis às de docentes, apesar da ausência de vínculo empregatício, fator este usado em comunicações por parte da PRIP para justificar a exclusão de seus filhos e filhas de editais de acesso às creches universitárias.
Chegaram a nós dois casos de mães pós-doutorandas, afiliadas a diferentes unidades da USP, que tiveram negado o acesso a vagas na creche e estão impossibilitadas de seguir suas pesquisas com seus arranjos pessoais atuais de conciliação de maternidade e atribuições acadêmicas.
Solicitamos que ações sejam tomadas, por parte da PRIP e da Reitoria da USP, para que tratamento similar a estudantes e docentes seja oferecido às mães pós-doutorandas e que o acesso às creches da universidade seja viabilizado, a fim de que sejam promovidas condições adequadas de continuidade das pesquisas existentes conduzidas por essas mães, sem prejuízo à sua vida pessoal e evitando assim a penalização da maternidade dentro da nossa instituição.
Camila Infanger Almeida, aluna de doutorado do Departamento de Ciência Política da FFLCH, e Ana Carla Batissoco, pós-doutoranda da FMUSP
Fortaleça o seu sindicato. Preencha uma ficha de filiação, aqui!
Mais Lidas
- Respeitem a USP!
- Adusp realiza Assembleia Geral na quinta-feira (22 de maio) para debater data-base
- Assembleia Geral da Adusp propõe ao Fórum que apresente ao Cruesp contraproposta de reajuste salarial entre 8,5% e 10%, e política de reposição
- Docentes surdas reivindicam criação de Departamento de Intérpretes de Libras na USP; atualmente, serviço é prestado por terceirizados(as), e fim dos contratos coloca atuação acadêmica em risco
- Seminário sobre formação de professores(as) da Educação Básica promovido por “cátedras” da PRPG e do IEA causa estranheza e indignação; abaixo-assinado elenca questionamentos