Memória
Vida e histórias de João Zanetic são celebradas em emocionante cerimônia que marcou primeiro ano do falecimento do professor, por duas vezes presidente da Adusp
Professor, militante, pai, companheiro, amigo, exemplo: foram muitas as dimensões de João Zanetic (1943-2024) exaltadas por colegas, amigos(as), familiares e ex-alunos(as) na emocionante cerimônia realizada pela Adusp em homenagem a “João Z”, como era conhecido, por ocasião do primeiro ano de seu falecimento.
A cerimônia foi realizada no último dia 6 de maio no auditório Adma Jafet do Instituto de Física (IF) da USP, unidade em que Zanetic ajudou a formar gerações de alunos(as) entre 1970 e 2013, quando se aposentou.

Vários depoimentos destacaram episódios de sua trajetória de vida desde muito antes do ingresso na universidade. Suzana Salem, docente sênior do IF, relatou histórias contadas pelo próprio Zanetic ao longo das décadas de amizade que mantiveram.
“Ele tinha muito orgulho de contar que sua mãe era analfabeta”, disse Suzana, acrescentando que a condição da família o obrigou a trabalhar de auxiliar de sapateiro aos dez anos de idade. Nos tempos do antigo ginásio, trabalhou numa farmácia e, aos 14 anos, participou de movimentos de protesto contra o aumento da tarifa de ônibus decretado pela Prefeitura de São Paulo, então comandada por Ademar de Barros. Zanetic escrevia poemas, contos e crônicas, e na época dedicou versos satíricos ao prefeito e à companhia de transportes metropolitanos.

Mais tarde, já no científico (atual ensino médio), Zanetic trabalhava num banco. Certa vez precisou faltar ao trabalho para poder estudar e assim evitar ficar em recuperação justamente em física. “Então ele tirou a única nota 10 da classe. Ficou tão empolgado que resolveu estudar Física e passou na então FFCL [Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras], na Maria Antônia”, relatou Suzana.
Anos mais tarde, eles se conheceram, já no câmpus do Butantã. “Eu estava comendo um sanduíche perto de onde era a antiga lanchonete e ele chegou comendo alguma coisa, sentou do meu lado e começamos a conversar. Para minha alegria, a conversa durou o resto da vida” — cinquenta e seis anos, lembrou Suzana, que integrou gestões da Diretoria da Adusp ao lado de Zanetic.
“Combatente incansável por uma sociedade igualitária”, diz Chico Miraglia
Zanetic ingressou na graduação da USP exatamente na época do golpe militar de 1964, ressaltou o professor Francisco Miraglia, docente sênior do Instituto de Matemática e Estatística (IME) da USP e ex-presidente da Adusp.
Na universidade, seguiu como estudante e depois como docente a militância que iniciara ainda nos tempos do ensino fundamental. “João Zanetic significa luta política pela emancipação do trabalhador brasileiro”, afirmou Chico Miraglia. “Sempre teve como perspectiva a transformação radical da sociedade, rumo ao socialismo democrático. Foi um combatente incansável por uma sociedade igualitária, pela justiça social e econômica, pelos direitos sociais fundamentais, como educação e saúde públicas, e considerava fundamental o nosso engajamento nas lutas da classe trabalhadora brasileira.”
Miraglia destacou o papel “absolutamente fundamental” de Zanetic na fundação da Adusp em outubro de 1976, como reação ao assassinato de Vladimir Herzog pela Ditadura Militar, ocorrido no ano anterior.
O próprio Zanetic, que viria a presidir a entidade em duas ocasiões, referiu-se a essa época num depoimento gravado em vídeo há alguns anos, do qual um pequeno trecho foi exibido na cerimônia.
“Em 1975 tivemos o assassinato de Vladimir Herzog, jornalista da TV Cultura e professor da ECA [Escola de Comunicações e Artes], e esse assassinato motivou a criação [da Adusp]. Vários docentes da USP se reuniram numa sala do então Departamento de Física e isso acabou levando à criação da Adusp”, contou Zanetic no vídeo.

O professor também participou das discussões que dariam origem ao Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN), em 1981, e sempre foi figura de destaque nos congressos da entidade, apontou Miraglia.
“Zanetic era um intelectual de porte, não só nos aspectos técnicos e epistemológicos da física, mas também no campo mais amplo da filosofia, da história e da literatura. Sua tese de doutorado, ligando física e literatura, é um texto que merece ser lido, porque é uma maravilha”, ressaltou. Até o final da vida, por sinal, Zanetic manteve seu interesse por diversas áreas do conhecimento, lendo e relendo seus autores favoritos, como Machado de Assis.
“Sua firmeza de propósitos, juntamente com sua perspicácia, calma, cordialidade, lucidez e bom humor, foram importantes para quem com ele conviveu, conversou, trabalhou e lutou, e eu tive o privilégio de ser uma dessas pessoas”, concluiu Miraglia.
Liderança democrática e voltada à união
A atuação de João Zanetic como liderança no movimento docente foi destacada por Marco Antonio Brinati, professor da Escola Politécnica e ex-presidente da Adusp. Brinati lembrou que conheceu Zanetic durante a greve de docentes em 1979, quando percorriam juntos as unidades para procurar mobilizar os(as) colegas.
Numa das reuniões, realizada na Poli, “o clima ficou tenso, criando-se a impressão de que um grupo representava os patrões e outro, os operários da unidade”.
“João procurava acalmar os ânimos e evitar confrontos, procurando convencer os interlocutores que nós estávamos ali para defender a universidade e não apenas os nossos salários”, relatou.

Brinati falou também sobre o surgimento do grupo Participação, que teve importante papel na vida da Adusp a partir do início da década de 1980, tendo vencido pela primeira vez a eleição para a Diretoria em 1987, com Chico Miraglia como presidente e Flávio Wolf de Aguiar e Márcia Regina Car como vice-presidentes.
“Instituímos na entidade práticas diferentes, como a Diretoria Ampliada, que incorporava docentes que se propunham a trabalhar em parceria com a entidade de modo mais cotidiano e não apenas em épocas de mobilização”, disse.
Em 1991, Zanetic foi eleito pela primeira vez presidente da Adusp, tendo Brinati como 1o vice-presidente. Seu segundo mandato seria na gestão 2009-2011. “João exercia sua liderança ouvindo, aceitando e valorizando as visões de todos. Sempre foi uma pessoa generosa que trabalhava pela união do grupo. Aprendi muito nessa convivência intensa com ele e passei a ter uma visão mais abrangente do papel da entidade e da universidade”, afirmou Brinati, que seria presidente na gestão 1995-97.
Ambos consolidaram uma “amizade muito forte”, qualificou Brinati, que perdurou por mais de 30 anos. Zanetic e Nana Hatakeyama, sua esposa, foram padrinhos de casamento de Brinati e Heloísa Borsari, docente do IME.
Generosidade para compartilhar experiência e conhecimento
Zanetic convivia com problemas de saúde decorrentes do diabetes e, em 2018, sofreu um acidente vascular cerebral que o deixou internado no Hospital Universitário (HU) por várias semanas. Brinati visitou-o no hospital e em casa em várias ocasiões, e se alegrou quando João e Nana compareceram à sua comemoração de 75 anos de idade. “Eram presenças muito importantes para mim. Fiquei muito feliz e lágrimas me vieram aos olhos quando eles chegaram”, contou.
“Espero que o seu exemplo possa iluminar os caminhos do Instituto de Física, da USP e da Adusp”, concluiu Brinati.
Heloísa Borsari participou de forma remota da cerimônia, fazendo um relato breve e emocionado. “Falar do João é muito fácil e muito difícil ao mesmo tempo. Até hoje acordo e às vezes acho que ele ainda está por aqui”, disse.
A professora participou de várias gestões da Adusp: foi 1ª secretária na primeira gestão de Zanetic na presidência e, em 2011, tornou-se a segunda mulher a presidir a entidade.
Heloísa ressaltou que aprendeu muito ao longo da convivência com Zanetic. “Em muitos momentos tive que recorrer a ele para saber o que fazer, para onde ir, e ele tinha sempre uma enorme generosidade, nada de vaidade em relação a tudo o que sabia e tudo o que podia partilhar com a gente”, disse.
“Eu sinto uma falta enorme do meu amigo, mais do que do militante, e por isso é tão difícil falar dele. Está aqui comigo, João, no meu coração”, encerrou, entre lágrimas.
Zanetic participou da luta pela recuperação do HU
A presidenta da Adusp, Michele Schultz, lembrou que ingressou como docente na universidade em 2007, “já numa assembleia da Adusp, em função da mobilização contra os atos declaratórios que atentavam contra a autonomia das universidades promulgados pelo [então governador José] Serra (PSDB)”.
“Gosto de contar isso porque, em vez de ir para a sala de aula, eu vim para uma assembleia da Adusp. E o João era uma das pessoas que para mim, enquanto ‘base’, recém-chegada e sem ter participado de movimento estudantil, foi uma referência”, afirmou.
Michele relatou ter convivido mais com Zanetic na primeira gestão da Adusp da qual participou, entre 2017 e 2019, quando o professor integrava a Diretoria Ampliada. “Sempre foi uma figura muito pacata no convívio, no entanto muito potente na luta. Por exemplo, na mobilização em defesa do HU.”

A participação de Zanetic na luta pela recuperação do HU, alvo de uma política de precarização e sucateamento desde a gestão reitoral M.A. Zago-V. Agopyan (2014-2017), foi citada por outros participantes da cerimônia. Lester Amaral Junior, integrante da coordenação do Coletivo Butantã na Luta (CBL), ressaltou que o professor se juntou, ao longo de meses, durante os finais de semana, às chamadas “ilhas de conversa” com a população das periferias para falar sobre a importância de defender a recuperação do hospital.
“Ele nunca perdeu a perspectiva da luta mais ampla”, destacou Amaral, que disse ainda jamais ter visto “o João confundir a firmeza de opinião com mau humor”.
Santana Silva, outro militante do CBL, também recordou uma história dos tempos da luta pela recuperação do HU. Num início de tarde de muito calor, contou, ele e Zanetic estavam panfleteando na Comunidade do Sapé, no Rio Pequeno, e foram descansar à sombra de uma árvore. Santana então perguntou: “João, como é que você aguenta? Eu estou bem cansado. A resposta dele ficou marcada: ‘O mundo é movido por muitas energias. A energia atômica, a eólica, a hidráulica etc., mas a mais forte e mais potente de todas é a energia ideológica’.”
Criação do Fórum das Seis mudou negociações com reitorias
Vários(as) participantes ressaltaram a importância de Zanetic na criação do Fórum das Seis, surgido na esteira da conquista da autonomia universitária, em 1989, e que na origem congregava as entidades representativas de docentes e funcionários(as) da USP, Unesp e Unicamp. Ao longo do tempo, foram incorporadas também as entidades estudantis e o Sindicato dos Trabalhadores do Centro Paula Souza (Sinteps).
Antes da criação do Fórum das Seis, lembrou Chico Miraglia, os(as) docentes faziam as negociações com os reitores, enquanto os(as) funcionários(as) negociavam com os vice-reitores. Zanetic insistia que isso não podia continuar assim, e lutou pela formação do Fórum das Seis.
A partir de então, os sindicatos negociam as reivindicações da data-base de outros temas diretamente com os reitores a partir de uma proposta de Pauta Unificada, o que é mantido até a atualidade. “Isso possibilitou a unificação das ações na mesa de negociação”, enfatizou Claudionor Brandão, diretor do Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp).
Magno de Carvalho, que por décadas integrou a Diretoria do Sintusp, afirmou que Zanetic “tinha uma relação muito peculiar com os funcionários da USP e com os trabalhadores em geral”. Entre outras atividades, o professor deu cursos de física para trabalhadores(as) e seus filhos e filhas.
Zanetic fez questão de se associar ao Sintusp, e permaneceu como membro e contribuinte até o final da vida. “Em momentos difíceis de greves, quando muitos nos criticavam, eles nos apoiava. Era diferenciada a posição dele”, testemunhou Carvalho.
Professor manteve luta constante pela educação pública
Carmen Sylvia de Moraes, docente da Faculdade de Educação (FE) e integrante do Grupo de Trabalho (GT) Educação da Adusp, lembrou a criação de uma revista que acompanhou “aquela conjuntura difícil por causa das políticas neoliberais do governo Fernando Henrique Cardoso”, na década de 1990.
“Eram intervenções no debate nacional sobre educação, fazendo a defesa da escola pública e de um projeto classista de educação. João tinha posicionamentos sempre firmes, consistentes, mas sem deixar de ser amável e sensato”, avalia a professora.
Carmen mencionou a atuação muito importante de Zanetic em projetos de oficinas de formação de professores(as), experiência que gerou uma política pública no campo da educação de jovens e adultos chamada Programa de Integração da Educação Profissional ao Ensino Médio na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos (Proeja). Zanetic, ressaltou ela, participou da luta por educação também ao lado dos movimentos sociais populares, não só nos sindicatos.
O professor integrou o GT Educação “até o fim da vida, com posicionamentos muito fortes em defesa da escola pública e críticas aos rumos que a universidade vem tomando de empresariamento e de privatização ‘branca’, como chamávamos, e que hoje é uma privatização escancarada”, afirmou Carmen. “Estão aí as cátedras de educação, dominadas pelo setor privado.”
“Tenho muita saudade do João, ele faz muita falta a todos nós”, concluiu.

Otaviano Helene, docente sênior do IF e ex-presidente da Adusp, mencionou a participação de Zanetic na edição da Revista Brasileira de Ensino de Física, que se mantém como uma das principais publicações da área.
Outro ponto que Helene destacou foi a atuação de Zanetic na formulação do Plano Estadual da Educação – Proposta da Sociedade Paulista, construído em 2003 por entidades acadêmicas, científicas, sindicais, estudantis e movimentos articulados por meio do Fórum Estadual em Defesa da Escola Pública (Fedep-SP). A proposta acabaria derrotada na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), em favor do texto do governo do Estado.
Como docente, formou professores e professoras que o têm como referência
A figura do Zanetic docente foi lembrada por vários(as) ex-alunos(as) que se manifestaram na cerimônia.
Leonardo Crochik, professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), recordou que seu primeiro contato com Zanetic foi durante atividades da greve de 2000, quando fazia parte do Centro Acadêmico do Instituto de Física (Cefisma).
“Demorei para ser aluno dele porque era do bacharelado. Lembro de vários colegas que estavam desiludidos e iam encontrar estímulo para permanecer no IF ao fazer uma disciplina de gravitação com o João. Ali encontravam um lugar para permanecer”, relatou.
De acordo com Crochik, Zanetic era “um grande contador de histórias” e deixou um legado presente também no campo simbólico, que “permanece num modo de fazer, num modo de pensar”. “João levava uma vida íntegra, com uma coerência gigantesca entre o que faz, o que fala e o que pensa, uma coerência com um frescor de uma integralidade da vida”, definiu.
Carlos MacDowell de Figueiredo, também professor do IFSP e servidor do Instituto de Física, relatou que mais da metade dos(as) professores(as) do curso de Licenciatura em Física do Instituto Federal são “filhotes do João”.
MacDowell de Figueiredo leu um cordel sobre a “festa da física no céu”, narrando o encontro de Zanetic com Mário Schenberg e Ernst Hamburger, ambos docentes de trajetória marcante no Instituto de Física.
Maria Beatriz Fagundes, docente da Universidade Federal do ABC (UFABC), referiu-se à saudade do professor, citando uma “alegria estranha” e ao mesmo tempo um sentimento bonito ao “ouvir as vozes do João em todos e todas nós” na cerimônia.
“Fui aluna dele logo no começo do curso, e foi uma sorte encontrar o João. Ele falava de física, mas falava de vida, de sonhar, falava de gente. Foi um grande privilégio ter podido conviver e aprender com o João”, disse Maria Beatriz.
Mônica Deyllot, professora do Colégio Técnico de Lorena (Cotel), ligado à Escola de Engenharia de Lorena (EL) da USP, ressaltou que “cada um que aqui fala ressuscita memórias preciosas”.
“Um dia vi o João numa aula de gravitação e aí me apaixonei e vi que a física não é matemática, mas que a matemática está presente e que atrás de cada equação tem uma poesia”, descreveu.
Mônica foi monitora de Zanetic, fez os cursos de férias ministrados pelo professor, integrou grupos de pesquisa e foi apresentada por ele à obra de Paulo Freire e ao trabalho da professora Lisete Arelaro, docente da FE. “A gente observa no João uma pessoa capaz de tocar no fundo de cada um e de lá ficar”, definiu.
Carlos Chaves, egresso do IF e professor na rede estadual, também trabalha no momento num projeto no Acervo Histórico do instituto. Chaves está organizando a documentação que ficou na sala de Zanetic, trabalho que tem demorado mais do que devia, reconheceu, porque acaba envolvido pelos detalhes de cada documento.
Chaves era aluno de graduação em 2020, quando a pandemia interrompeu todas as atividades presenciais. De forma geral, disse, “o IF nos tratou muito mal, ao não reconhecer as especificidades daquele momento”.
Na época, um grupo de estudantes se uniu para formar uma chapa para concorrer à Diretoria do Cefisma. Eram cerca de vinte pessoas, mas os meses foram passando e em algum momento não havia mais de três pessoas. “A certa altura pensamos em fazer uma entrevista com Zanetic. O grupo enviou um e-mail, rapidamente respondido por ele”, contou. “No momento em que falamos com ele, e com a Suzana Salem um pouco depois, tudo aquilo nos deu uma força enorme. Aqui na USP o Cefisma, muito por conta dessa força, foi o primeiro centro acadêmico a estar na rua para levar gente para lutar pela vacina. E essa força veio desse exemplo”.
Em família, um contador de histórias e viajante pelo interior do Brasil
Os depoimentos sobre a vida pessoal e familiar de Zanetic foram dados na cerimônia pela sua companheira, Nana Hatakeyama, e pelos filhos, André e Mariana, do primeiro casamento.
“Para o meu pai não existia a atuação de pesquisador e professor sem a discussão e a reflexão sobre ensino e escola públicas”, afirmou Mariana.
Em casa, Zanetic procurava oferecer muitos estímulos à vida cultural, presenteando o filho e a filha com livros e discos, e incentivando-os a frequentar cinema, teatro e outras atividades.
André mencionou o lado contador de histórias do pai, marcante a ponto de até hoje o filho recordar passagens de algumas delas.

“Meu pai tinha um prazer legítimo, visceral, pelo conhecimento, pela vida, pela natureza”, disse. “Fico muito feliz e emocionado de ouvir essas histórias [na cerimônia] e de sentir que muita gente gostava muito do meu pai, que foi alguém realmente importante para muita gente, que tocou as pessoas.”
André relatou que, no final do ensino médio, não sabia bem o que fazer na faculdade. Na época, produziu um trabalho escolar sobre marxismo do qual gostou muito. O pai então perguntou: por que você não faz ciências sociais? “Até hoje eu brinco que sou a única pessoa que teve um pai que falou para o filho fazer ciências sociais”, contou.
André fez mestrado, doutorado e pós-doutorado na USP e em várias ocasiões aproveitava para almoçar com o pai no câmpus. “No caminho, ele sempre parava para olhar as flores. Ele não era religioso, mas tinha uma ideia bastante espiritual. Se a gente estava aqui, era para admirar essa beleza, ele dizia”, lembrou o filho.
Nana Hatakeyama, companheira de Zanetic, enfatizou que ele falava com orgulho de sua origem de classe.
“Para quem conviveu com ele diariamente por quase trinta anos, preciso falar a verdade: nós nunca tivemos uma briga. Ele escutava, com uma calma oriental, depois a gente entrava num acordo”, contou. “Na vida diária era uma pessoa calma, tranquila, tinha uma ótima relação com os filhos.”
Outro aspecto salientado por Nana é que Zanetic “era um ótimo companheiro de viagem”. O casal optou por conhecer o estado de São Paulo, o Brasil e países da América Latina, em vez de outros continentes.
“Íamos para cidadezinhas do interior e realmente a gente se deliciava com essa vidinha. Não precisávamos ir para a Europa. Queríamos conhecer o Brasil e a América Latina”, disse.
O tempo passou rápido, comentou. “Eu falava para ele: nossa, já foram 25 anos, 28 anos… Eu muito me orgulho de ter vivido com ele e sinto muitas saudades”, concluiu.
“Uma das pessoas mais generosas que conhecemos”, define Diretoria da Adusp
A presidenta da Adusp, que estava na mesa de coordenação, leu várias mensagens e manifestações enviadas por pessoas que acompanharam a cerimônia pela Internet.
Ao final, os(as) presentes puderam deixar mensagens num livro de recordações. Um caderno com fotos, depoimentos de João e notas de entidades, feito por Michele Schultz, também foi entregue à família. Nele, a Diretoria da Adusp incluiu a seguinte manifestação:
“O colega João Zanetic – vulgo João Z. para nós… – foi uma das pessoas mais generosas que conhecemos e com quem tivemos o prazer de conviver. Muito democrático e extremamente respeitoso com qualquer que fosse e sempre bem-humorado ele se tornava quase de imediato ‘um amigo de infância’ de quem o conhecesse, dada a empatia que emanava e não por acaso. De suas inúmeras qualidades, João Z. era useiro e vezeiro em brincar, inclusive consigo mesmo, provocando uma atmosfera descontraída no ambiente em que estivesse. Contumaz disciplinado frente ao diabetes tipo 2, se não estamos enganados, João Z. estava sempre acompanhado de um pâncreas postiço e ambulante, como costumava brincar, depositado em uma pequeno recipiente que embalava sua droga inseparável, a insulina, responsável também por lhe proporcionar umas rodadas de cachaça pra conversa séria e, igualmente, pra jogar conversa fora… Mas engana-se quem pensa que João nunca ficava furioso, ficava sim mas apenas toda vez que constatava alguma injustiça para com a classe trabalhadora e com a população subalternizada. Militante inveterado, contribuiu para a construção da Adusp. João Z. está incrustado na nossa memória e assim o homenageamos. João Zanetic, presente!”
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