Memória
Setembrino Petri, “gigante” das geociências e da paleontologia, parte aos 100
O professor emérito Setembrino Petri, admirável geólogo e paleontólogo e ex-diretor do Instituto de Geociências (IGc-USP) e do Museu Paulista, faleceu nesta quarta-feira (1/3), aos 101 anos incompletos, deixando comovida a comunidade científica.
Nascido em Amparo (SP) em 1922, Petri completou 100 anos em 25 de setembro do ano passado e era o mais antigo membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC), que lamentou seu desaparecimento lembrando, entre suas diversas contribuições, os notáveis estudos taxonômicos e bioestratigráficos sobre os foraminíferos brasileiros (organismos unicelulares associados ao plâncton), tornando-o “primeiro paleontólogo brasileiro a interessar-se pelo estudo de foraminíferos fósseis” e um dos pioneiros da micropaleontologia brasileira.
Entre as diversas manifestações de pesar pela morte de Setembrino, chama atenção, por sua sensibilidade, aquela de autoria do professor Paulo César Boggiani, do IGc, publicada no dia seguinte. “Toda a comunidade do Instituto de Geociências está consternada com a notícia recebida ontem”, diz a nota de Boggiani. “Difícil acreditar, o professor Setembrino nos deixou mal acostumados. Pensávamos que nunca ia nos deixar e ficávamos planejando mais uma celebração de seu aniversário, marcado como data oficial do Instituto: dia 25 de Setembro”.
Prossegue lembrando alguns aspectos marcantes da atividade do docente: “Estamos tristes, mas nos sentimos privilegiados por poder contar com a presença dele pelos corredores do Instituto, vê-lo lendo – sem óculos! – na biblioteca era um incentivo aos estudos. Na segunda feira [27/2], talvez pela primeira vez se dando conta que estava na hora de partir, manifestou para sua filha sua vontade de ser velado no IGc. O que será realizado, com a lembrança do pátio cheio, onde comemorávamos seus aniversários”.
Petri graduou-se em História Natural em 1944, na USP, onde prosseguiu os estudos, obtendo o doutorado em História Natural em 1948. Ingressou na instituição como professor, tornou-se livre docente em 1957 e titular em 1973, aposentando-se em 1985. Foi geólogo do Conselho Nacional do Petróleo. Colaborou com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) como membro do comitê assessor (1990-1993) e na coordenação da área de Ciências da Terra (1992-1993).
De acordo com a ABC, suas pesquisas na área das geociências incluem sedimentos e rochas pré-cambrianas a holocenas de diversas regiões brasileiras. “A publicação dos resultados de sua pesquisa científica ultrapassa uma centena de artigos, além de livros e diversos capítulos de livros. Merece destaque sua preocupação com o ensino pré-universitário e universitário das Geociências. Para esse fim, traduziu e adaptou obras estrangeiras e elaborou apostilas sobre Estratigrafia, Sedimentologia e Geologia Histórica”.
Na opinião do Departamento de Geologia do Instituto de Geociências e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Setembrino foi um exemplo para todos que conviveram com sua grandeza, simplicidade e companherismo. “Faleceu o grande mestre de todos nós, querido professor Setembrino Petri. Professor Setembrino significa muito e tem um imensurável valor para a Geologia do Brasil e para cada um dos geólogos brasileiros, especialmente para nós todos que convivemos com sua grandeza, simplicidade, parceria, companherismo e grande conhecimento. Sua trajetória é um marco na história das Geociências em nosso país! Sua vida, pessoal e acadêmica, é exemplo de cientista, professor e orientador”, registra a nota de pesar da instituição de Rio Claro.
O texto termina de forma tocante: “Diante da imensidão do espaço e da profundidade do tempo, foi uma honra e um privilégio para todos nós termos conhecido e dividido parte de nossa existência com o Mestre Setembrino. Seus átomos, nesse eterno reciclar natural, voltam à litosfera. Sua energia, porém, permanece a nos inspirar. Descanse em paz PROFESSOR SETEMBRINO PETRI. Até sempre!” (em maiúsculas no original).
Renato Ghilardi, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Paleontologia (SBP), também divulgou nota de condolências. “Autor de inúmeros artigos e livros e detentor de inúmeros títulos e condecorações, mantinha a mente irrequieta em constante busca pelo saber até os últimos momentos de sua profícua vida. Não consigo me furtar das lágrimas ao lembrar de sua emoção em ser convidado a escrever um capítulo no livro de contos que a SBP promoveu em 2022”, diz a nota de Ghilardi, que é professor da Unesp de Bauru.
“Algumas pessoas tiveram a sorte de, como eu, tê-lo participando na maioria das bancas de avaliação de progressão acadêmica mas só naquele momento, naquele fugaz momento de sua vida onde o professor Petri se comoveu e chorou agradecendo a possibilidade de relembrar seu primeiro campo no Devoniano do Paraná, que pude entender definitivamente a grandeza daquele homem e o quanto ele via a paleontologia como parte integradora de sua vida”.
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