Comissão da Verdade
Na Geografia, repúdio ao golpe de Rodas

Docentes, funcionários e estudantes compareceram ao ato de protesto convocado pelo Fórum Aberto pela Democratização da USP contra a decisão da Reitoria de compor uma “Comissão da Verdade” sem consulta e sem participação das diferentes categorias que compõem o corpo da universidade. Realizado em 23/5 na Geografia (foto), o ato contou com a participação de pessoas que já haviam sido eleitas pelas entidades para fazer parte da comissão, caso dos docentes Marilena Chauí (FFLCH) e Pedro Paulo Chieffi (FM). Também compareceu o deputado Adriano Diogo (PT), presidente da Comissão Estadual da Verdade Rubens Paiva, da Assembleia Legislativa.
Daniel Garcia |
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“Fomos surpreendidos pela portaria 6.172. O reitor Grandino Rodas sabotou a campanha do Fórum”, declarou o estudante Rafael Pacheco, o primeiro a se manifestar. “Foi um golpe institucional”, definiu o aluno, que falou em nome do Fórum. Antes, ele traçou um retrospecto da luta pela democratização na USP desde a década de 1960, pontuando os momentos mais marcantes da campanha pela criação da Comissão da Verdade da USP, lançada em 2012.
Gustavo Rego, que representou o Diretório Central dos Estudantes-Livre Alexandre Vannucchi Leme, classificou o gesto da Reitoria como uma expressão de autoritarismo, destinada a esconder os crimes da Ditadura. “O golpe de Rodas demonstrou como a Comissão da Verdade é necessária, é um elemento fundamental para a democratização da Universidade. O que está instalado hoje é a Comissão da Mentira. É preciso instalar uma Comissão da Verdade que tenha legitimidade”, disse o estudante. Ele garantiu o engajamento do DCE-Livre numa campanha com este objetivo.
Herança
O professor João Zanetic, que falou em nome da Adusp, destacou o fato de que a luta pela democratização da USP vem de longa data, antes mesmo do golpe de 1964. Observou que a decisão de produzir o histórico livreto Controle Ideológico na USP (citado pelo representante do DCE-Livre), publicado originalmente em 1978, foi tomada em uma assembleia da Adusp. Após ler as palavras finais do livro, Zanetic traçou uma analogia com a situação atual: “O golpe de Rodas demonstra que ainda não varremos a herança ditatorial da nossa Universidade”.
Daniel Garcia |
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Marilena, Chieffi, Solange Veloso e Claire Sekkel |
A atitude da Reitoria tem um “objetivo claro, que é ocultar a verdade”, disse Magno Carvalho, diretor do Sindicato dos Trabalhadores da USP. A posição do Sintusp é de que os representantes das categorias levem em frente a proposta original do Fórum: “A Comissão da Verdade eleita deve assumir, pela legitimidade que tem, o seu papel de investigação, com o apoio de toda a comunidade. Teremos dificuldades, mas dá para fazer esse trabalho”. A proposta será submetida ao Fórum, acrescentou Magno.
“Ficamos frustrados com a portaria de 7 de maio”, admitiu Mariana Rubiano, representante da Associação dos Pós-Graduandos Helenira Preta Rezende. “Vamos encampar a campanha pela Comissão da Verdade Democrática. Vamos seguir o exemplo de Helenira e lutar obstinadamente por memória, verdade e justiça”.
“Receio”
A Comissão da Verdade da Faculdade de Direito da USP (CV-FD) aprovou, por maioria, uma moção de repúdio à comissão oficial da Reitoria. O funcionário Alexandre Pariol, membro da CV-FD, explicou que uma posição unânime de repúdio só não foi possível em razão do receio de alguns professores que a integram: “Foi uma manobra muito bem feita: o reitor colocou na presidência o professor emérito da Faculdade de Direito, Dalmo Dallari”.
O funcionário Domenico Colacicco Neto, um dos indicados pela categoria para fazer parte da Comissão da Verdade, lembrou a necessidade de revisão da Lei da Anistia, a qual permite a impunidade dos torturadores, e apontou a permanência de traços da Ditadura na conjuntura atual: “Os movimentos sindicais nesse país continuam sendo tratados como caso de polícia, apesar do mal falado Estado Democrático de Direito. Na USP não é diferente, continuamos sofrendo com processos”.
A professora Angela Mendes de Almeida, também escolhida como representante dos funcionários, propôs ao deputado Adriano Diogo que a Comissão Estadual da Verdade realize uma audiência pública sobre o “golpe de Rodas”. Angela, que é viúva de Luiz Eduardo Merlino, jornalista e aluno da USP assassinado pela Ditadura, explicou que é ex-funcionária da USP e agradeceu aos funcionários por ter sido honrada com a indicação.
“Nenhuma comissão da verdade vai prevalecer sem que se crie uma correlação de forças na sociedade para derrotar os torturadores”, disse Adriano Diogo, após reforçar a necessidade de revisão da Lei da Anistia, conforme sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos. “É uma tarefa do povo brasileiro e não só da Comissão Nacional da Verdade enfrentar o Estado militar, secreto, torturador”, enfatizou depois o parlamentar, em alusão a estruturas ditatoriais que no seu entender permanecem intactas.
O presidente da Comissão Estadual da Verdade lembrou que no Estado de São Paulo os órgãos de repressão da Ditadura Militar assassinaram 154 pessoas. Ele criticou duramente os docentes nomeados para a comissão oficial da Reitoria: “É lamentável que pessoas que até respeitamos tenham emprestado seus nomes para o Rodas. É uma vergonha”.
“Golpe astuto”
A professora Marilena Chauí preferiu não se manifestar durante o ato de protesto: “Eu sempre falo, hoje estava querendo ouvir”. Ao final, aceitou conversar com o Informativo Adusp sobre a manobra da Reitoria. “Um golpe extremamente astuto, pela escolha das pessoas. Não há ninguém ali que não tenha um histórico de combate à Ditadura”, disse ela, referindo-se aos membros da comissão nomeada pelo reitor.
“Estamos confrontados com uma estratégia de ação institucional muito bem feita, muito eficaz, de desmoralização de tudo que se opõe a ela”, declarou a professora da FFLCH. Na sua avaliação, o reitor “se apoderou da ideia”, ou seja, da proposta de Comissão da Verdade reivindicada pelo Fórum, “e a transformou naquilo que ele pode comandar”. Houve, sintetizou Marilena, “uma demonstração de força, de poder, e uma neutralização, pelo alto, de qualquer veleidade de investigação”.
O professor Pedro Paulo Chieffi defende que os docentes indicados pela Adusp reúnam-se para avaliar a situação criada pelo reitor, que a seu ver é complexa e requer cuidadosa reflexão.
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