Planejada para acomodar onze macas, a sala de observação do Pronto-Socorro Adulto do Hospital Universitário (HU) da USP tem recebido sistematicamente nas últimas semanas uma ocupação superior ao dobro da capacidade, chegando a ter pacientes acomodada(o)s em poltronas por dias enquanto aguardam uma maca.

Na semana passada, diz a Superintendência do HU em comunicado divulgado nesta sexta-feira (21/7), “esta situação se agravou quando havia nove pacientes em poltronas esperando vagar uma maca na sala de observação”. Esse contexto “caracteriza o colapso do sistema de saúde, quando há um número de pacientes para atender muito superior à capacidade operacional dos estabelecimentos de assistência à saúde”, reconhece a Superintendência.

Na última quarta-feira (19/7), a administração do HU já havia divulgado comunicado no qual informava a criação de um Comitê de Gerenciamento de Crise. No aviso desta sexta, a Superintendência reafirmou as medidas anunciadas dois dias antes. São elas:

“- Comunicação para a CRUE [Central de Regulação de Urgência e Emergência, administrada pelo município], CROSS [Central de Regulação da Oferta de Serviços de Saúde, administrada pelo governo estadual], SAMU [Serviço de Atendimento Móvel de Urgência, fone 192] e COBOM [Corpo de Bombeiros, fone 193] solicitando que não fossem mais encaminhados pacientes para o PSA do HU.

– Suspensão do atendimento de demanda espontânea do PS Adulto.

– Suspensão das cirurgias eletivas até o dia 31 de julho, exceto as cirurgias ambulatoriais que não necessitam de leito de internação.

– Comunicação à Reitoria da USP.

– Criação do Comitê de Crise que se reúne às 7h30m, diariamente para avaliar a situação do HU e definir encaminhamentos.”

O comunicado diz ainda que, “por orientação do reitor” da USP, Carlos Gilberto Carlotti Jr., “solicitamos reunião conjunta com as Secretarias Estadual e Municipal de Saúde para discutirmos a situação do atendimento de Urgência e Emergência na região oeste do Município de São Paulo”.

“Paralelamente estão sendo rediscutidas junto às áreas assistenciais as mudanças necessárias nas rotinas de internação nas unidades e de agendamento e programação das cirurgias eletivas e de urgência para que os recursos assistenciais do HU sejam plenamente utilizados dentro do atual cenário assistencial que nos encontramos”, conclui a Superintendência.

Serviços de regulação encaminham pacientes mesmo sem haver leitos disponíveis

De acordo com a administração do HU, a situação do hospital “se tornou muito mais grave quando o hospital foi obrigado a ser referência de urgência e emergência para toda a região oeste do Município de São Paulo, (Butantã, Lapa e Pinheiros)”, área que tem em torno de 600 mil habitantes.

A CRUE, aponta a Superintendência, “pode encaminhar pacientes oriundos de qualquer parte da Capital, dependendo da situação de momento dos serviços de urgência e emergência”. “A regulação com frequência encaminha pacientes para os hospitais de referência, mesmo sabendo que o PS do hospital de destino se encontra lotado, por ser a alternativa que se encontra em melhor (ou menos pior) condição para receber o paciente”, diz o comunicado.

A Superintendência reconhece também as limitações provocadas pela escassez de pessoal, ao dizer que “o término dos contratos temporários, criados para o enfrentamento da pandemia, sem a sua plena reposição fez com que fosse necessário reduzir o número de leitos operacionais do hospital”.

De fato, os números do HU se caracterizam por um cenário de queda livre desde o desmonte da instituição, que pode também ser caracterizado como “colapso”, iniciado em 2014 pela gestão reitoral M.A. Zago-V. Agopyan, que tentou inclusive desvincular o hospital da USP.

Uma comparação dos números do Anuário Estatístico da USP dos anos de 2014 (com dados de 2013) e de 2023 (dados de 2022) é bastante ilustrativa quanto ao tamanho do desmonte. Em número de consultas médicas, a redução foi de 163 mil para 63 mil. O hospital tinha 233 leitos ativos, contra 145 em 2022. As internações despencaram de 982 para 421, menos da metade.

O número de funcionária(o)s também dá a medida do colapso: eram 1.853 em 2013, e somente 1.393 no ano passado.

Em artigo publicado no Jornal da USP em maio de 2022, Michele Schultz e César Minto, atual e ex-presidente da Adusp, respectivamente, apresentaram dados que comprovam o “célere desmonte do HU”, conforme denunciado desde o título. O artigo nunca recebeu resposta por parte da reitoria, da superintendência de saúde ou do HU.

SUS precisa oferecer alternativas na região, diz médico do HU

As medidas anunciadas pela Superintendência “apenas mitigam a crise”, avalia um médico que trabalha no HU, “porque diminuiu a superlotação”. “Extrapolar a capacidade é recorrente, mas não podemos ter aquele absurdo de estarmos com dez pacientes com indicação cirúrgica no PS e sem leitos para internação”, disse o profissional ao Informativo Adusp.

“Tínhamos pacientes admitidos há mais de 24 horas no PS, tomando antibiótico na veia, analgésico potente para a dor e esperando uma maca. Até mesmo casos que precisariam de operação e não tinham uma maca para deitar. Era esse o patamar do absurdo”, descreve. Na avaliação do médico, receber um(a) paciente sem que ele(a) tenha sequer uma maca para deitar o(a) coloca numa situação pior do que antes.

De acordo com o profissional, adiar as cirurgias eletivas “é correto porque você não pode continuar admitindo paciente eletivo(a) quando não tem leito para paciente de urgência”. “É uma questão ética de quem deve ser tratado primeiro”, diz.

Para encaminhar soluções mais perenes seria necessário recompor o quadro de pessoal e a capacidade de atendimento do HU, porque “estamos num território em que a população só aumenta e vem envelhecendo”. Ou seja, “em relação a 2014, temos uma capacidade de atendimento que diminuiu, mas a demanda só aumenta”, diz.

No entanto, “o HU não pode ser a única alternativa num território de mais de meio milhão de habitantes”. “A gestão municipal, não apenas a atual, nunca ofereceu uma alternativa de atendimento hospitalar que demande cirurgia e internação. Isso não se resolve com UPA [Unidade de Pronto Atendimento]”, afirma.

O médico considera portanto que, sem que o Sistema Único de Saúde (SUS) ofereça alternativas de atendimento na região, mesmo a recomposição da capacidade do HU será insuficiente para dar conta da demanda. “Falta hospital público no território”, constata.

Carlotti Jr. nega ampliação do atendimento e fala em fazer hospital “funcionar bem”

O reitor da USP já declarou publicamente que não vai investir na recuperação dos níveis de atendimento anteriores a 2014. “A ideia é manter o HU funcionando, não é ampliar o HU. Eu sei que vocês gostariam que o HU funcionasse com duzentos e poucos leitos, mas não vamos fazer isso. O HU custa hoje R$ 383 milhões. Não é um valor pequeno”, disse em reunião do Conselho Universitário no dia 7/3. “Aquilo lá tem que funcionar bem. Agora, não vamos ampliar porque é um serviço de saúde extremamente caro”, pretextou.

Em sessão da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) no dia 21/6, Carlotti Jr. reafirmou que a USP vai “investir no HU e contratar dentro do possível, provavelmente não ampliando, mas mantendo bem o que está lá e melhorando a infraestrutura”.

A realidade, no entanto, insiste em se mostrar bastante diferente da concepção do reitor – um médico, assim como Zago – do que seja “manter bem o que está lá”. Procurada pelo Informativo Adusp por meio da Assessoria de Imprensa do HU, a Superintendência do hospital não se manifestou.

Leia a íntegra do Comunicado divulgado pela Superintendência do HU nesta sexta-feira (21/7)

Como é de conhecimento geral, as unidades de Pronto-Socorro do Sistema Único de Saúde vêm, de longa data, vivenciando uma situação de superlotação, com pacientes que acabam internados em unidades destinadas à observação, aguardando uma vaga de internação, ou exames diagnósticos, ou recursos como cirurgia ou atendimento de especialidade. Este contexto caracteriza o colapso do sistema de saúde, quando há um número de pacientes para atender muito superior à capacidade operacional dos estabelecimentos de assistência à saúde. A pandemia de Covid-19 foi um fator de agravamento desta situação pelo atraso de tratamentos clínicos e cirúrgicos que ficaram represados e agora impactam os serviços de saúde.

No caso do HU, esta situação não é diferente e se tornou muito mais grave quando o hospital foi obrigado a ser referência de urgência e emergência para toda a região oeste do Município de São Paulo, (Butantã, Lapa e Pinheiros). Também, o término dos contratos temporários, criados para o enfrentamento da pandemia, sem a sua plena reposição fez com que fosse necessário reduzir o número de leitos operacionais do hospital.

O Pronto Socorro do HU recebe pacientes que vêm espontaneamente e pacientes encaminhados pelas centrais de regulação de urgências e emergências, pelo SAMU 192, (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) e pelo COBOM 193 (Corpo de Bombeiros).

Existem duas centrais de regulação, uma administrada pelo Município, a CRUE Central de Regulação de Urgência e Emergência e a CROSS Central de Regulação da Oferta de Serviços de Saúde, administrada pelo governo estadual.

Através da CRUE o HU recebe pacientes encaminhados prioritariamente das unidades da Região Oeste Pronto Socorro da Lapa, AMA Sorocabana e Pronto Socorro Bandeirantes. Entretanto, a CRUE pode encaminhar pacientes oriundos de qualquer parte da Capital, dependendo da situação de momento dos serviços de urgência e emergência. A regulação com frequência encaminha pacientes para os hospitais de referência, mesmo sabendo que o PS do hospital de destino se encontra lotado, por ser a alternativa que se encontra em melhor (ou menos pior) condição para receber o paciente. Como citado acima, este é o contexto de um sistema em colapso.

A sala de observação do PS adulto do HU, planejada para acomodar onze macas tem ficado sistematicamente com mais do dobro de ocupação e mais recentemente, começamos a ter pacientes acomodados em poltronas por dias, aguardando uma maca vagar. Na semana passada esta situação se agravou quando havia nove pacientes em poltronas esperando vagar uma maca na sala de observação. Por esta razão por orientação da Superintendência, foram tomadas as seguintes medidas:

– Comunicação para a CRUE, CROSS, SAMU e COBOM solicitando que não fossem mais encaminhados paciente para o PSA do HU.

– Suspensão do atendimento de demanda espontânea do PS adulto.

– Suspensão das cirurgias eletivas até o dia 31 de julho, exceto as cirurgias ambulatoriais que não necessitam de leito de internação.

– Comunicação à Reitoria da USP

– Criação do Comitê de Crise que se reúne às 7h30m, diariamente para avaliar a situação do HU e definir encaminhamentos.

Por orientação do Reitor Professor Carlos Gilberto Carlotti Junior, solicitamos reunião conjunta com as Secretarias Estadual e Municipal de Saúde para discutirmos a situação do atendimento de Urgência e Emergência na região oeste do Município de São Paulo.

Estas medidas serão mantidas por tempo indeterminado dependendo da evolução da situação.

Paralelamente estão sendo rediscutidas junto às áreas assistenciais as mudanças necessárias nas rotinas de internação nas unidades e de agendamento e programação das cirurgias eletivas e de urgência para que os recursos assistenciais do HU sejam plenamente utilizados dentro do atual cenário assistencial que nos encontramos.

A Superintendência

EXPRESSO ADUSP


    Se preferir, receba nosso Expresso pelo canal de whatsapp clicando aqui

    Fortaleça o seu sindicato. Preencha uma ficha de filiação, aqui!