Geral
Istvan Jancsó, mais um guerreiro que parte
Solicitamos à professora Zilda Iokoi (FFLCH) um depoimento sobre o professor Istvan Jancsó (IEB), falecido em 23/3. Por muitos anos, Istvan e Zilda foram colegas no Departamento de História, antes que ele assumisse a direção do Instituto de Estudos Brasileiros. O depoimento da professora:
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Professor istvan Jancsó em assembléia (23/5/2007) |
“Seria muito triste, neste momento de perda, não perceber que o homem seguro de suas idéias e princípios, que formou multidões de alunos, pudesse ser lembrado, como se a morte física fizesse desaparecer todo o construto cultural, político e afetivo que deixou. Suas raízes estão firmes no chão da terra, no imaginário de todos nós e no sentimento de que a aventura vivida e compartilhada pelos próximos e distantes produzirá novas possibilidades de enfrentamento da vida cotidiana, mesclada pelas singularidades de suas idéias e a clareza de apresentá-las nos debates públicos. Elas percorrem todo o território nacional em que esteve presente ao longo dos anos em que atuou no Departamento de História da Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo, antes na Federal da Bahia ou como executivo na 3M, em momentos difíceis de nossa história política.
São muitos os lugares em que esteve. Em cada um deles plantou projetos de grande envergadura. Foi sempre amoroso no debate, firme na argumentação, e fazia com que os interlocutores, sempre qualificados, pudessem ouvir e divergir sem que isso provocasse rupturas pessoais.
Grande anfitrião, gostava de receber para comer as delícias húngaras que fazia com apoio da mãe e bebericar longamente refletindo sobre o que fazer para criar um ambiente menos burocrático, que permitisse um viver libertário para todos. Também costumava, no inverno, receber os colegas em sua sala para um chá ou um destilado, acompanhado do cigarro Gitanes.
Concedeu a Murilo Leal um longo depoimento sobre as estratégias que implementou na multinacional em que dirigia o setor de recursos humanos para a formação da comissão de fábrica nos meados dos setenta do século XX. Esteve presente nos encontros dos trabalhadores mobilizados nas lutas contra a ditadura e nas campanhas de rua daquele período.
Sorriso largo, chegava sempre muito cedo e saía do trabalho quando seus alunos assim o permitissem, especialmente porque gostava de ouvir suas idéias, questões e considerações sobre temas de suas inquietações históricas, políticas e pessoais.
Entusiasmo
Deixou o Departamento, transferindo-se ao Instituto de Estudos Brasileiros, onde agregou-se ao projeto de transferência de parte da Biblioteca Mindlin à USP. Neste trabalho que o encantou dedicou parte importante de suas energias e entusiasmo.
Nos últimos anos, desconcertou-se com o rumo das polaridades no enfrentamento das dificuldades da área de humanas na USP, solidarizou-se com as lutas dos trabalhadores no campus universitário, debateu com os estudantes e professores sobre o paredismo sem mediação, mas em hipótese alguma colocou-se individualmente contra as decisões coletivas que culminaram em momentos de impasse perigosos para a sobrevida da instituição universitária.
Em 2007, teve papel importante na comissão mediadora do processo de ocupação da Reitoria, e junto com João Adolfo Hansen, Paulo Arantes, Chico de Oliveira e Luis Renato Martins conseguiu um acordo final positivo, num momento em que os conflitos entre os diferentes grupos de estudantes, funcionários e Reitoria apontavam para uma desagregação sem precedentes.
A mim, em particular, dedicou amizade e apoio nos momentos mais difíceis de minha trajetória na universidade, ladeando-me quando de conflitos com estudantes, oferecendo apoio e solidariedade quando atacada pela mídia, ou ainda quando fui submetida às duas últimas cirurgias. Com ele pude divergir, compartilhar, viver momentos pessoais e trocar afetos respeitosos profundos. Ele representa mais um guerreiro que tombou, tornando a luta mais penosa e triste.”
Informativo nº 303
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