Em assembleia realizada na segunda-feira (21/8), as e os estudantes do curso de Letras da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) decidiram paralisar as atividades nos próximos dias 29 e 30/8, para pressionar a Reitoria da USP a contratar, imediatamente, mais docentes para os diferentes departamentos e, desse modo, evitar o colapso iminente de algumas das sete habilitações. Além disso, a assembleia deliberou que, no caso de suas reivindicações continuarem desatendidas, o corpo discente do curso entrará em greve após a Semana da Pátria.

Uma primeira paralisação das(os) estudantes de Letras ocorreu em 10/5. Na ocasião, durante a realização de um protesto em frente à Reitoria, um grupo formado por estudantes e docentes do curso foi recebido pelo coordenador do Gabinete do Reitor, a quem foi entregue um detalhado dossiê sobre o grave problema da falta de docentes, que chega a ser dramática em três departamentos: os de Letras Orientais (DLO), Letras Modernas (DLM) e Letras Clássicas e Vernáculas (DLCV).

De lá para cá, porém, a situação apenas se agravou, sem que a direção da FFLCH ou a Reitoria tenham tomado qualquer medida para deter o desmonte do curso. O reitor Carlos Gilberto Carlotti Jr. não se deixou sensibilizar nem mesmo pelos contundentes depoimentos prestados no dia 18/5 em audiência pública na Assembleia Legislativa, convocada pelo deputado Carlos Giannazi (PSOL), e que contou com grande participação de estudantes e docentes das diversas habilitações de Letras.

“Nessa paralisação, nós vamos fazer atividades dos estudantes na Letras. A ideia não é paralisar para ficar em casa, mas mobilizar os estudantes, reunir, fazer aula pública sobre a greve de 2002 e sobre as demais movimentações dentro da USP. Temos comissões de base, que são comissões das habilitações da Letras, e esses dias de paralisação são importantes para que a gente tenha atividades dessas comissões no horário de aula”, disse ao Informativo Adusp Online Luiza Arantes, que é aluna da habilitação em Chinês e integrante do CAELL.

Os muitos problemas enfrentados pelas habilitações são resumidos em boletim do Centro Acadêmico de Estudos Linguísticos e Literários “Oswald de Andrade” (CAELL): Coreano perdeu suas duas únicas optativas; Japonês acaba de perder uma disciplina obrigatória; uma turma de língua do Espanhol foi cancelada, e estudantes foram obrigados a cursar duas disciplinas de língua ao mesmo tempo; “a disciplina de Metodologia do Ensino de Alemão foi cancelada porque perdeu seu único professor”; e no Francês, “duas turmas de uma mesma disciplina viraram uma só”. De acordo com a publicação, “são dezenas de alunos[as] que, mesmo em seu período ideal, têm ficado sem aulas. Há professores[as] com turmas lotadas, com 200 a 250 alunos[as]”.

Outras sérias distorções e riscos provocados pela falta de docentes são apontados na publicação do CAELL. “A disciplina de Metodologia do Ensino de Línguas Orientais é a mesma para todas as habilitações do DLO — são sete línguas!”, protesta a liderança discente. “O Japonês ainda corre o risco de perder as aulas no noturno. As vagas para o Inglês e o Espanhol foram reduzidas”. No seu entender, a a Reitoria apresenta um plano de contratações a longo prazo, mas a crise de Letras precisa ser resolvida agora. “Reformular a grade curricular de Letras, agora, é incorporar o desmonte à nossa formação”, denuncia o boletim do CAELL.

Manifesto estudantil revela situação crítica da habilitação em Coreano

A Comissão de Alunos da Habilitação em Coreano do curso de Letras da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH-USP) divulgou, no dia 17/8, manifesto no qual é apontada a situação extremamente crítica dessa habilitação, que no momento conta com apenas duas docentes, e só uma delas em Regime de Dedicação Integral à Docência e à Pesquisa (RDIDP). A outra docente atua em Regime de Turno Completo (RTC), que implica jornada de vinte horas semanais. Um terceiro docente, professor temporário, teve seu contrato encerrado no primeiro semestre de 2023, o que provocou “cancelamento de duas disciplinas optativas devido a um remanejamento necessário para preservar as obrigatórias”.

No manifesto, a comissão apresenta suas reivindicações, que incluem até a contratação, “em regime de urgência”, de um professor temporário. “Há, ainda, a necessidade de mais 1 (um) cargo docente em regime de RDIDP, além da conversão do cargo docente RTC (em fase de contratação) para RDIDP, chegando assim, ao número mínimo de três professores contratados em regime de dedicação exclusiva que auxilie tanto nas atividades acadêmicas quanto burocráticas da habilitação, reduzindo a exorbitante carga de trabalho da coordenadora do curso”.

No entender da comissão, “é notório” que as duas professoras atuais não são capazes de atender à necessidade do curso em seu currículo mínimo. “A não renovação do professor temporário, que ocasionou o cancelamento de duas matérias optativas — ‘Tópicos de Cultura Coreana Contemporânea’ (33 alunos matriculados) e ‘Tópicos de Literatura Coreana II’ (28 alunos matriculados) — tinha o intuito de salvaguardar as obrigatórias, mas trará consequências mais nefastas para o próximo ano, em que se considera não receber novos alunos”.

Ainda segundo o documento, o fim de um ano inteiro de curso, “sem a entrada de calouros em uma habilitação que cresce a cada ano devido a sua popularidade”, resulta em menos oportunidades e menos profissionais para atuar na academia e na sociedade. “É uma regressão completa e contrastante com o discurso atual da universidade de ser uma das melhores da América Latina. Vale ressaltar que a Habilitação do Coreano não é a única do Departamento de Letras Orientais (DLO) que resiste ao desmonte progressivo das habilitações e sofre com a falta de professores”, diz a comissão.

“Em 14 de junho de 2012, ainda na fase de implementação do curso, a Comissão de Claros Docentes havia concedido 2 cargos docentes permanentes [em] RDIDP (Processo 2010.1.2655.8.1/Informação 001CA/2012). Entretanto, o concurso foi cancelado em 11/2/2014 através da Portaria GR 6.502, e a primeira contratação em regime de RDIDP veio a acontecer somente em 2018. Portanto, desde o início do curso, a continuidade das atividades acadêmicas vem sendo mantida de forma precária, em nada condizente com o desenvolvimento do curso nos quesitos de aumento do número de alunos, internacionalização e retenção”.

O Curso de Língua e Literatura Coreana da USP, criado em 2013 no Departamento de Letras Orientais (DLO), “é o primeiro e único curso de graduação na área da América do Sul e já é considerado o principal pólo de Estudos Coreanos da América Latina, tendo sediado o XII Encontro de Estudos Coreanos da América Latina (EECAL) em 2015”, afirma a comissão de estudantes. No entanto, decorridos dez anos de criação, conta com número de docentes aquém do mínimo recomendável.

O manifesto destaca que em 2023 a habilitação “registrou uma das maiores notas de corte de toda a Letras”, e que levantamento recente feito pela Seção de Alunos mostrou que o Coreano mantém a maior taxa de retenção de alunos(as) dentro do DLO. “Por fim, o curso tem enviado e recebido alunos de intercâmbio de forma intensa, incluindo bolsas de estudos recebidos diretamente do governo coreano”.

A longo prazo, conclui o documento estudantil, é necessário que a USP “se comprometa com um novo modelo de contratação e avaliação de necessidades de cada habilitação periodicamente, para que não haja mal-entendidos na distribuição de docentes e [se] evite a necessidade de situações desesperadoras”.

Turmas chegam a ter 250 alunos e salas de aula estão sempre superlotadas

Samira Clissa, aluna da habilitação em Alemão, relatou ao Informativo Adusp Online uma série de problemas enfrentados pelo corpo discente. “No semestre passado, logo no começo do curso, meu professor de Língua Alemã I ficou doente e não tinham contratado um professor substituto. Depois de algumas semanas sem aula, recebemos a notícia de que nossa disciplina teria de ser cancelada por falta de docente. Felizmente, meu professor se recuperou e conseguiu dar o curso, mas as outras habilitações não tiveram a mesma sorte”, diz ela.

“No semestre passado eu tinha quatro matérias obrigatórias do Português, e na interação de matrícula não consegui vaga em nenhuma das turmas, pois todas elas estavam lotadas. Então mandei requerimento para os professores, mas uma matéria não foi aceita, então fui pessoalmente falar com o professor e ele me aceitou na turma dele”, prossegue Samira.

“Neste semestre, tive duas amigas que não poderão cursar uma matéria obrigatória, Literatura Brasileira II, porque os três professores estão com as turmas cheias. Temos essa matéria duas vezes na semana e vale 4 créditos, não poder cumpri-los atrasa a graduação, pois a gente fica fora do período ideal e fica ainda mais difícil conseguir vaga mais para frente”, avalia a estudante, que considera extremamente problemática a superlotação das salas de aula.

“Tem vezes que chegamos atrasados na aula e simplesmente não tem lugar para sentar. Já tive que ver aula sentada na mesa do professor enquanto alguns colegas assistiam à aula no chão. As turmas são ‘super’ cheias, algumas chegam a ter 250 alunos, tendo aula com um único professor”.

EXPRESSO ADUSP


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