O reitor Carlos Gilberto Carlotti Jr. comemorou, na sessão da reunião do Conselho Universitário (Co) realizada no último dia 3 de junho, o fato de que a USP está a caminho de “retornar” a 2014 no que diz respeito ao número de docentes efetivos(as). De acordo com a Reitoria, somando-se o quadro atual de efetivos(as) às contratações já providas pela Comissão de Claros Docentes (CCD) e àquelas aprovadas mas ainda não efetivadas, a USP atingirá o total de 6.039 docentes. Vale dizer que esse número não considera as saídas que continuarão a ocorrer, decorrentes de aposentadorias, falecimentos e exonerações.

“Autorizamos cerca de 1.400 [contratações], vamos voltar àqueles 6.100 [docentes] que tínhamos em 2014, que foi o compromisso que nós fizemos, vocês se lembram, que nós íamos repor 2014 [sic]”, disse Carlotti Jr. ao Co. A referência ao ano se deve ao início do congelamento de contratações de docentes e funcionários(as), determinado pela gestão reitoral M.A. Zago-V. Agopyan (2014-2017).

Ocorre que, a julgar pelos dados apresentados na sessão e o tempo necessário para realização dos concursos, a meta não será alcançada até o final da gestão Carlotti Jr.-Nascimento Arruda, em janeiro de 2026, como o reitor quis insinuar em sua fala.

Do total de 1.463 contratações previstas ao longo de toda a gestão, conforme Luan Novak, servidor da Secretaria-Geral da universidade que fez a exposição dos números na sessão do Co, 383 têm o status atual de “aprovadas” pela CCD.

Novak informou também que as contratações já efetuadas pela atual gestão têm levado em média nove meses desde a publicação do edital. Ora, se há 383 cargos no momento apenas “aprovados” pela CCD, esses processos não serão concluídos ainda no mandato de Carlotti Jr. O déficit de docentes na universidade, portanto, será um legado com o qual a próxima gestão terá que se haver.

Total de contratações efetivadas é de 844 e inclui processos da gestão anterior

O montante de 1.463 cargos previstos, apontou Novak, inclui processos autorizados na gestão anterior, mas que não puderam ser concluídos na época por conta das restrições impostas pela Lei Complementar (LC) 173/2020, que implementou o programa federal de enfrentamento à pandemia da Covid-19 e entre outras medidas proibiu contratações no serviço público de maio de 2020 a dezembro de 2021. Essas efetivações, cujo total não foi discriminado pelo servidor, foram realizadas apenas na gestão Carlotti Jr.-Nascimento Arruda.

De acordo com os números apresentados pela Secretaria-Geral, foram providos até o momento na gestão 844 cargos (docentes já incluídos/as na folha de pagamentos). A mediana de idade dos(as) novos(as) docentes, informou Novak, é de 39 anos, sem grande variação entre as diferentes áreas.

O segundo bloco do total anunciado pela Reitoria é de 619 cargos. Eles incluem os 383 já aprovados pela CCD, mas cujos processos estão em diferentes etapas, o que também não foi detalhado na apresentação ao Co. Em 159 casos os concursos estão em andamento, e 77 cargos estão em fase de nomeação.

De acordo com Novak, a USP tinha 5.181 docentes efetivos(as) no início da atual gestão, em 2022. Em janeiro de 2014, eram 6.026. Em setembro de 2014, quando os dados da universidade passaram a ser publicados na sua página de Transparência na Internet, eram 5.934 docentes efetivos(as). De acordo com levantamento realizado pela Adusp a partir das informações da folha de pagamentos da universidade, em maio de 2025 o número de docentes efetivos(as) chegou a 5.124 — ainda longe portanto da meta de mais de 6 mil alardeados pela gestão.

Confira aqui a evolução do número de docentes por unidade entre 2014 e 2025, apurada pela equipe da Adusp com base em informações publicadas pelo Portal da Transparência da USP.

Menos docentes, mais demandas

O quadro docente da USP diminuiu consistentemente desde que os dados passaram a ser publicados no Portal da Transparência. As quedas mais expressivas foram registradas a partir de 2019, e a situação se agravou com a proibição de contratações durante a pandemia. Embora o número tenha aumentado nos dois últimos anos, principalmente depois da greve estudantil de 2023 que denunciou a falta de docentes, o quadro docente ainda está muito aquém do total pretendido pela atual gestão.

As demandas feitas aos e às docentes, no entanto, só aumentam. Na comparação entre 2014 e 2024, de acordo com o Anuário Estatístico da USP, o número de cursos de graduação aumentou de 300 para 327. As áreas de concentração da pós-graduação eram 353 no mestrado e 323 no doutorado, enquanto em 2024 chegaram, respectivamente, a 452 e 421.

Além disso, os(as) docentes foram submetidos a crescentes exigências e cobranças decorrentes do produtivismo acadêmico e dos processos de pretensa avaliação implementados nos últimos anos. A falta de servidores(as) técnico-administrativos(as) e as condições de trabalho impõem mais demanda às e aos docentes. Os resultados se fazem sentir em sobrecarga de trabalho e adoecimento de professores e professoras.

O atual déficit de docentes e a consequente precarização das condições de trabalho têm ligação direta com as políticas da gestão reitoral M.A. Zago-V. Agopyan — responsável pelo projeto “USP do Futuro”, formulado pela consultoria McKinsey&Co — que tiveram sequência com V.Agopyan-A.C. Hernandes (2018-2021) e Carlotti Jr.-Nascimento Arruda (2022-2025).

A pretexto de uma “crise econômico-financeira”, além de congelar as contratações, Zago deu início ao sucateamento do Hospital Universitário (HU), fechou arbitrariamente a Creche Oeste, promoveu a “desvinculação” do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais de Bauru (HRAC) e lançou duas edições do Programa de Incentivo à Demissão Voluntária (PIDV). Os reflexos dessas e de outras medidas deletérias se fazem sentir até hoje, sem que tenham sido tomadas providências eficazes para reverter tais políticas. Sob esse ponto de vista, não deixa de ser curioso que Carlotti Jr. tenha utilizado na sessão do Co a expressão “a USP está em 2014”. A referência era ao número de docentes efetivos(as), mas em muitos aspectos de fato a situação da universidade remonta àquele ano.

“É nítido que o volume de trabalho aumentou nos últimos anos, especialmente depois do período da pandemia em que as atividades remotas se somaram às que realizamos presencialmente, uma equação que contribui para fazer avançar o produtivismo acadêmico. Entre outras razões, a gestão não conseguirá atingir nem metade das contratações que alardeia porque o corpo de servidores(as) técnico-administrativos(as) foi reduzido desde 2014 com os planos de demissão voluntária, ou PIDV”, diz a professora Michele Schultz, presidenta da Adusp.

“Escutamos representantes da Reitoria tentarem atribuir a ‘culpa’ pela demora às unidades ou a candidatos(as) que interpõem recursos, o que atrasaria o processo de contratação. Ocorre que cada etapa de um concurso público que preze pela transparência, probidade e pelos direitos das e dos candidatos, deve ser estritamente respeitada pelos(as) gestores(as). Para isso, tem de haver planejamento”, adverte.

EXPRESSO ADUSP


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