No dia 13 de junho, a Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (Fineduca) emitiu dura nota sobre os planos em estudo no governo federal de desvincular os recursos para educação e saúde. A Constituição Federal prevê, no caput do seu artigo 212, que a União aplicará, anualmente, “nunca menos” de 18% “da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.” Já o mínimo de aplicação na saúde é de 15% da receita de impostos.

“A garantia da destinação de um percentual mínimo da receita de impostos para a manutenção e desenvolvimento do ensino foi uma conquista da sociedade brasileira, inserida pela primeira vez na Constituição Federal de 1934 e só retirada nos períodos ditatoriais (Estado Novo, com Vargas, e na ditadura militar)”, destaca a Fineduca.

“Eis que, em plena democracia, e vigência de um Plano Nacional de Educação, com a maioria das metas não cumpridas, a grande mídia reverbera o discurso de tecnocratas (sempre eles, como diria a saudosa Maria da Conceição Tavares) de que a garantia dos mínimos constitucionais para a saúde e educação comprometeria o novo arcabouço fiscal (regime fiscal sustentável) e propõe, simplesmente, o descumprimento de nossa Carta de Direitos, a Constituição Cidadã, como a chamava Ulysses Guimarães”.

A educação, lembra a Fineduca, “representa investimento na formação das gerações futuras e tem impacto na formação das crianças e na qualificação de jovens e adultos que têm acesso à escola”, gerando portanto “retornos quantificáveis em termos de crescimento econômico, melhoria de renda e de outras condições da existência”, e, consequentemente, “maior receita de tributos, contribuindo, dessa forma, para o equilíbrio das contas públicas”.

Se há um “conflito entre o arcabouço fiscal e a vinculação de recursos para educação e saúde”, prossegue a nota, “isto significa que ele foi mal elaborado” e que sua formulação deve ser alterada “no sentido de não promover cortes em duas áreas fundamentais para o futuro do país”, porque é “contraditório que um regime fiscal tenha o adjetivo de sustentável e impacte negativamente áreas essenciais para o desenvolvimento econômico e social”.

Ainda segundo a Fineduca, a desvinculação constitucional de recursos mínimos para as áreas da saúde e da educação, “que é o que de fato ocorrerá se forem estabelecidos limites de gastos que desrespeitem a evolução da receita de impostos federais, significará o comprometimento da realização de políticas públicas nestas áreas tão fundamentais à maioria da população brasileira”. Em um contexto em que se faz necessário maior aporte de recursos para as duas áreas garantirem direitos constitucionais às parcelas mais pobres, continua, “é inaceitável que o governo federal alimente o coro daqueles que propõem retirar dos pobres os recursos para garantir um ajuste fiscal que beneficia a elite econômica e seus lobistas, alimentando a cadeia de desigualdade social que impera em nosso país”.

O último Relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) adverte que o Brasil precisa investir em educação caso queira superar os indicadores de desigualdade amplificados na pandemia, diz a nota, antes de lembrar que o Plano Nacional de Educação (PNE) aprovado pelo Congresso Nacional em 2014 determinou o aumento do gasto público em educação para 7% do PIB até 2019, e, no mínimo, 10% até 2024.

“E a Conferência Nacional de Educação, realizada em janeiro de 2024, sob o comando do governo Lula, definiu a meta de que os recursos da educação atinjam o equivalente a 10% do PIB até 2034. No entanto, segundo relatório de monitoramento das metas do PNE publicado pelo INEP, em 2020, o Brasil aplicava apenas 5,1% em educação pública. A única forma de ampliar esses gastos passa por um maior esforço federal, pois é este nível de governo que possui maior capacidade de arrecadação de tributos e de estabelecer novas fontes de recursos baseadas na riqueza nacional”, diz a Fineduca.

“A desvinculação dos recursos da educação e saúde é uma ideia recorrente, porque são setores cujo montante de recursos é expressivo, embora insuficiente quando analisado o investimento por aluno. Afinal, são quase 40 milhões de crianças, jovens e adultos que dependem das escolas públicas para exercerem o direito à educação. Neste quesito, é importante frisar que o Brasil investe por aluno das escolas públicas de educação básica apenas US$ ppp [paridade por poder de compra] 3.583 por ano, enquanto a média dos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) é de US$ ppp 10.949 por ano, de acordo com o relatório anual da OCDE sobre educação (Education at a Glance, 2023)”, prossegue a nota.

“Internamente, quando analisados os valores por aluno disponíveis para financiar a educação em cada rede municipal e estadual do país, de acordo com dados do FNDE de 2022, metade delas tem até R$ 800 por mês para financiar o direito à educação para cada criança. Ou seja, mesmo com a vinculação constitucional, o Brasil fica muito aquém do padrão de investimento da OCDE (atinge apenas um terço da média deles) e ainda precisa fazer esforços para reduzir as desigualdades entre as redes”.

Assim, a eventual retirada da vinculação “fatalmente colocará os recursos da educação como alvo fácil das disputas políticas subnacionais que visam resultados eleitorais de curto prazo porque o retorno do investimento na educação é no longo prazo e somente governos comprometidos com o futuro da nação o fazem de forma inegociável”, com consequências irreparáveis para a manutenção das escolas públicas e para a garantia do direito à educação das crianças.

No entender da Fineduca, as “forças de mercado e seus tecnocratas” bradam contra a vinculação para a educação e saúde por saberem que “povo educado é povo crítico, que não aceita uma dinastia de banqueiros e/ou de rentistas”. A promessa de um governo que “representasse o resgate das bandeiras históricas do Partido dos Trabalhadores e outros partidos progressistas com relação à educação, saúde, meio ambiente e desenvolvimento econômico e social inclusivos”, diz a entidade, foi o que garantiu a eleição do governo Lula. “Portanto, é inaceitável que este governo assuma políticas que têm orientação neoliberal”, arremata. Confira aqui a nota na íntegra.

EXPRESSO ADUSP


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