Carreira docente
Nulidades em concurso para Titular na FD, e homologação em menos de 24 horas, levam docente a recorrer à justiça
Candidato declarado vencedor é desembargador do TJ-SP
A professora Daisy Gogliano, da Faculdade de Direito (FD-USP), prepara-se para recorrer à justiça contra o resultado de concurso de Professor Titular de Direito Civil realizado em maio de 2014, no qual foi proclamado vencedor o outro candidato, professor Nestor Duarte, que é desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP). A professora também interpôs recurso administrativo, imediatamente após o concurso, e obteve da Congregação da FD a suspensão da homologação do resultado.
Posteriormente, porém, a Congregação rejeitou o recurso, levando Daisy a recorrer ao Conselho Universitário (Co), que ainda não agendou o julgamento do caso.
A homologação do concurso foi realizada em menos de 24 horas, em clara violação do prazo de 10 dias para eventuais recursos, que o Regimento Geral da USP concede no artigo 254. Mas os procedimentos da banca julgadora também feriram o Edital do concurso, segundo a professora Daisy, para quem ocorreram diversas nulidades.
No recurso apresentado à Congregação, a professora argumenta que o professor Nestor Duarte não exerce atividades na pós-graduação, portanto não poderia receber nota nesse quesito. Também, segundo Daisy, ele não apresentaria engajamento institucional. Ademais, a professora sustenta que o candidato não conseguiu demonstrar erudição, ao passo que ela sim; por isso, exigiu acesso à gravação das respectivas provas (aulas), realizada em notebook da faculdade.
Furto de prova?
O diretor da FD, professor Rogério Tucci, informou, então, que a gravação foi prejudicada por um problema técnico. Quando a professora impetrou uma ação cautelar de produção antecipada de provas, solicitando apreensão do equipamento e perícia na gravação, a Procuradoria Geral da USP apresentou à 5ª Vara da Fazenda Pública um boletim de ocorrência: o notebook teria sido furtado em 17/9/14, “antes mesmo do ajuizamento da presente cautelar”, mas bem depois de iniciado o processo 2012.1.747.2.9 USP, no qual a professora pede a nulidade parcial de notas atribuídas no concurso (as razões finais apresentadas por Daisy à Congregação da FD, por exemplo, datam de 15/8/14).
Na opinião de Daisy, o desaparecimento do notebook configura um “crime penal”, pois quebra o princípio da segurança jurídica, e um claro cerceamento do direito ao recurso, o que conduz à nulidade do concurso. “Eles se esqueceram de que a Faculdade de Direito é pública. O agente público tem que agir com transparência total”.
Chamam ainda a atenção, no caso, as notas discrepantes concedidas na prova de erudição. Dois componentes da banca, a professora Giselda Hironaka e o professor Luiz Fachin, atribuíram ao candidato Nestor notas 10 e 9,5 respectivamente, o que destoou dos outros três componentes, que lhe atribuíram nota 8. Por outro lado, na mesma prova Giselda e Fachin deram à candidata Daisy notas 8 e 9, respectivamente. A recorrente afirma que Giselda incorreu em “conflito ético”, porque “ministra aulas da graduação com o candidato professor Nestor Duarte”.
Nota 8?
Hoje Professora Associada, contratada em Regime de Turno Completo (RTC), Daisy Gogliano ingressou na carreira em 1985, tendo exercido o magistério exclusivamente na USP ao longo de 30 anos. Orienta alunos de mestrado e doutorado e tem dois livros publicados. No entanto, na prova de títulos, a professora Giselda atribuiu-lhe nota 8, com base na seguinte avaliação: “Afora a participação em bancas, sua participação na vida administrativa da FD é nenhuma”. Ocorre que Daisy foi membro da Congregação nos períodos 1993-2007 e 2012-2014; participou de comissões de sindicância da faculdade, tendo emitido 34 pareceres em processos administrativos; é membro do Comitê de Bioética do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) desde 2001.
O candidato vitorioso, Professor Associado contratado em Regime de Turno Parcial (RTP), recebeu nota 9 da professora Giselda na prova de títulos, embora não tenha orientandos nem lecione na pós-graduação e tenha um livro publicado. “Sua publicação docente não é insuficiente, mas deixa, de certa forma, a desejar, eis que tem, na verdade, apenas um livro publicado […]. Também no ítem ‘orientação de alunos’ anoto certa insuficiência. Sua participação na vida administrativa da FDUSP é pequena”, avaliou a própria Giselda.
Procurado pelo Informativo Adusp, o professor Nestor Duarte comentou, sobre não preencher os requisitos quanto às atividades de pós-graduação: “A nota do memorial é global, sendo esse um dos aspectos a serem considerados, o que decorre de se tratar de concurso público e não de acesso funcional, sendo exigível o título de livre-docente”.
Quanto à prova de erudição, o professor afirmou que “a banca é vinculada, somente, aos tempos mínimo e máximo da aula e pertinência do tema, ficando o mais dentro da apreciação subjetiva dos examinadores, sendo que nenhum deles me atribuiu nota de reprovação”. Declarou, ainda, que “a impugnação da eminente professora Daisy Gogliano já foi objeto de apreciação pela Egrégia Congregação que a rejeitou, acolhendo parecer conjunto subscrito por três ilustres Professores Titulares”.
Normalidade
A professora Giselda Hironaka declarou ao Informativo Adusp que, a seu ver, “o concurso transcorreu dentro da absoluta normalidade acadêmica e ética”. Entende que não existiu “nenhum conflito ético, uma vez que os critérios a serem levados em consideração pelos julgadores, na avaliação da aula de erudição, são relacionados à pertinência do tema e à observância do tempo de exposição”. Ainda: “Quanto à existência de erudição, ou não, nesta prova, a verificação pertence exclusivamente aos julgadores”.
Para Giselda, nos concursos para Professor Titular, a indicação prevalece sobre as notas concedidas: “Convém anotar que, ainda que eu mesma houvesse dado notas máximas nos itens reclamados pela candidata, a minha indicação (ainda assim) prosseguiria sendo para o candidato vencedor do concurso. Não são as minhas notas que levaram, portanto, ao resultado final. Portanto, se fosse possível, administrativa ou judicialmente, alterar as notas dadas pela banca, seria isto que aconteceria no meu caso: nada se alteraria e a minha indicação prosseguiria sendo a mesma”.
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