Carlotti Jr. propõe novo degrau na carreira docente e reconhece que reservas da USP são resultado do arrocho salarial
Em reunião do Co, Carlotti Jr. admite que USP fez reservas com arrocho salarial (USP Imagens)

O reitor Carlos Gilberto Carlotti Jr. anunciou na última sessão do Conselho Universitário (Co) da USP, realizada nesta terça-feira (27 de maio), que pretende apresentar ainda durante a sua gestão, que está no último ano, uma proposta para “fazer duas correções” nas carreiras dos(as) docentes e dos(as) servidores(as) técnico-administrativos(as).

De acordo com o reitor, a carreira docente tem poucos degraus. Em consequência, o(a) professor(a) “sobe muito pouco”. A ideia, explicou, é acrescentar ao menos um degrau “para que [o/a docente] possa chegar um pouco mais à frente e ter um salário mais valorizado”.

Em relação aos e às funcionários(as), a proposta seria o contrário, ou seja, reduzir o número de degraus, porque as etapas são muito numerosas e dificilmente o(a) servidor(a) chega ao topo dentro da sua categoria (Básico, Técnico ou Superior), alegou.

No caso dos(as) funcionários, avalia Carlotti Jr., o processo seria menos complexo porque a USP tem autonomia para realizar a mudança. Já para os(as) docentes, “é preciso fazer uma discussão com a Unesp e a Unicamp”, uma vez que o plano de carreira é o mesmo nas três universidades estaduais paulistas.

Para justificar a ideia, Carlotti Jr. apresentou quadros comparativos dos salários (valores iniciais, médios e máximos) nas duas carreiras. No caso dos(as) funcionários(as), o salário inicial equivale, em geral, a 50% do salário médio. Entre os(as) docentes, a diferença é bem menor, de acordo com o quadro apresentado pelo reitor na reunião.

É importante frisar que os números utilizados no quadro dos(as) professores(as) referem-se ao Regime de Dedicação Integral à Docência e à Pesquisa (RDIDP), não consideram os descontos dos encargos sociais e incluem o valor do auxílio-saúde e dos vales-alimentação e refeição.

Quadro apresenta salários de RDIDP, somando auxílios e sem considerar desconto dos encargos

Carlotti Jr. disse que espera poder apresentar “alguma posição” em relação ao tema na reunião temática do Co sobre carreira docente, agendada para o dia 23 de junho. “Não sei se vou conseguir esse objetivo porque vocês sabem que temos até o meio do ano para fazer essa modificações por causa das nossas leis eleitorais na universidade”, ressalvou. “Gostaria muito de fazer porque acho que foi o que faltou fazer nesta gestão.”

USP fez “reserva financeira” ao não conceder reajustes salariais

Carlotti Jr. também justificou a concessão do reajuste de 5,51% pelo Conselho de Reitores das Universidades Estaduais Paulistas (Cruesp) na negociação da data-base com o Fórum das Seis. O Co aprovou o percentual de reajuste por 99 votos favoráveis e duas abstenções.

Na avaliação do reitor, o ICMS vai crescer ao redor de 8% a 9% neste ano, abaixo da expectativa da Secretaria da Fazenda e Planejamento. Mas um reajuste de 8% — proposto, aliás, pelo Fórum das Seis na segunda reunião de negociação, no dia 26 de maio, que acabou se revelando uma não negociação — não foi concedido “porque temos outros compromissos salariais”, disse.

Esses compromissos são a progressão na carreira dos(as) servidores(as) e a progressão horizontal para os(as) docentes. Inscreveram-se nesse processo 1.421 docentes, de um total de 1.975 aptos(as), informou na reunião a vice-reitora Maria Arminda do Nascimento Arruda.

“Se eu der os 8%, não vamos poder dar a progressão, porque ela precisa caber dentro do orçamento. Precisamos ter caixa para fazer a progressão, além do reajuste salarial e além do crescimento vegetativo da folha”, argumentou Carlotti Jr.

O reitor apresentou ainda um gráfico com os cálculos do Cruesp segundo o qual os reajustes acumulados nos últimos quatro anos (20,67% em 2022; 10,51% em 2023; 5% em 2024; e 5,51% em 2025) chegam a 47,74%, enquanto a inflação calculada pelo IPC-FIPE no período foi de 26,65%.

“Isso era um compromisso da gestão, que iríamos repor a inflação do período e fazer uma recuperação salarial de anos anteriores. Não foi uma recuperação não planejada porque vocês lembram que tivemos um período sem reajuste salarial”, disse Carlotti Jr., referindo-se inclusive a anos anteriores à pandemia da Covid-19, quando “ainda não estávamos no equilíbrio financeiro da universidade”.

O reitor reconheceu que a USP fez sua “reserva financeira” entre 2020 e meados de 2022. Recorde-se que, de maio de 2020 a dezembro de 2021, reajustes salariais e contratações no serviço público estavam proibidos pela legislação federal em função do programa de enfrentamento à Covid-19.

Dessa forma, Carlotti Jr. admite aquilo que a Adusp e o Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp) vêm reiteradamente denunciando, ou seja: que a universidade tem feito caixa à custa do arrocho salarial dos(as) servidores(as). No final de 2024, as reservas da USP chegavam a quase R$ 8 bilhões.

A USP voltou a conceder reajustes em 2022, primeiro ano da gestão Carlotti Jr.-Maria Arminda, “não porque nós assumimos, foi porque as condições permitiam também”, disse Carlotti Jr. “Não é uma crítica ao professor Vahan [Agopyan, reitor entre 2018-2021], ele fez o que tinha que fazer.”

“Concordo com a Adusp: o bom é a gente ter salário”, diz Carlotti Jr.

Pouco depois da primeira reunião de negociação entre Cruesp e Fórum das Seis, em 19 de maio, a USP anunciou um reajuste no valor do vale-alimentação, que passou de R$ 1.290,00 para R$ 1.950,00.

Na reunião do Co, o professor Marcílio Alves, representante da categoria de professores(as) titulares, questionou Carlotti Jr. sobre a possibilidade de concessão de um reajuste equivalente também para o vale-refeição.

Lançando mão de uma versão bastante livre dos fatos da negociação, Carlotti Jr. disse ter sido “duramente criticado” na segunda reunião do Cruesp com o Fórum das Seis “por ter dado aumento no vale-alimentação”. “Até me surpreendi por ter sido tão criticado por ter dado o aumento”, ironizou.

O que de fato ocorreu, conforme relata o Boletim do Fórum das Seis, é que a coordenadora do Fórum e presidenta da Adunicamp, professora Silvia Gatti, disse que todas as categorias, em suas assembleias de base, manifestaram grande insatisfação da categoria com o índice de 5,51% oferecido na primeira reunião de negociação, em 19 de maio.

“A indignação foi ainda maior quando, menos de 24 horas depois, fomos surpreendidos com anúncios de aumento nos vales nas três universidades, numa clara demonstração de que era possível avançar na recuperação de perdas”, disse Silvia, referindo-se ao vale-alimentação na Unesp (que foi de R$ 1.502,00 para R$ 2.000,00), ao vale-refeição na Unicamp (de R$ 40,00 para R$ 43,00, sendo que o VA já estava em R$ 1.950,00 desde janeiro) e ao aumento do VA na USP. A crítica das entidades, portanto, não foi ao aumento dos vales, mas à escolha do Cruesp em não valorizar os salários quando há condições para tal.

Marcílio Alves afirmou também que houve um “ar de decepção” com o reajuste na lista de discussão dos(as) titulares, com 24 docentes manifestando descontentamento, embora outros(as) 33 tenham demonstrado apoio.

“Você pode me colocar com um voto a mais aí nos insatisfeitos”, respondeu o reitor. Na sequência, revelou uma rara concordância com posições historicamente defendidas pela Adusp.

“Eu não gosto de vales, eu gosto de aumento de salário. Eu concordo com os sindicatos, concordo com a Adusp: o bom é a gente ter salário”, afirmou. “Os vales são um jeito que a gente encontrou para valorizar principalmente aqueles que têm um salário menor, mas o aumento salarial seria o meu grande objetivo, e eu vou tentar ainda na minha gestão fazer alguma coisa para que possamos ter uma mudança estrutural nas carreiras, garantindo obviamente um melhor salário tanto para os servidores quanto para os professores.”

Arrecadação do ICMS cresce, mas comprometimento com a folha cai

A representação dos(as) servidores(as) rebateu a argumentação do reitor de que não era possível conceder um reajuste maior no momento. Neli Wada, diretora do Sintusp, ressaltou que o comprometimento com a folha na USP ficou em 84,32% em abril, enquanto a projeção para o acumulado do ano, já considerando o reajuste salarial e do VA, além das progressões, é de 83,45%.

“Isso significa que a arrecadação do ICMS está crescendo, porque o comprometimento está caindo”, afirmou. Neli lembrou ainda que os(as) funcionários(as) ficaram dez anos sem progressão na carreira, o que ajudou a USP a fazer caixa.

Marcello Ferreira dos Santos, o “Pablito”, também representante da categoria, ressaltou que, mesmo com os reajustes concedidos a partir de 2022, o acumulado de perdas salariais de docentes e funcionários(as) desde 2012 é de 17,5%, percentual reivindicado pelo Fórum das Seis nas negociações com o Cruesp. “Os reajustes foram altos nos anos anteriores porque as nossas perdas salariais foram maiores ainda”, enfatizou.

Pablito também mencionou questões da pauta específica dos(as) funcionários(as) e denunciou a precarização das condições de trabalho em muitos setores da universidade, atingidos pela falta de pessoal e pela substituição de funcionários(as) por trabalhadores(as) terceirizados(as).

EXPRESSO ADUSP


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