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Adusp ajuíza ação contra o Estado para suspender aumento das alíquotas de contribuição previdenciária dos docentes
Medida que integra pacote da reforma da Previdência do Estado, que passou a vigorar em março, é qualificada como confisco por instituir “progressividade abusiva, sem a criação de benefícios correspondentes ao aumento e sem a consideração atuarial da situação superavitária decorrente das elevadas contribuições”. Além disso, sustenta o sindicato, os projetos que deram origem à reforma estadual não apresentaram os estudos atuariais exigidos pela Constituição. Entendimento idêntico dessa questão levou o desembargador Marrey Uint, do TJ-SP, a suspender o aumento e a progressividade da alíquota para os filiados do Sinafresp
A Adusp ingressou nesta quarta-feira (24/6) com ação judicial contra o Estado de São Paulo, na qual requer, com a concessão de tutela de urgência, a imediata suspensão do aumento das alíquotas de contribuição previdenciária dos docentes, determinado pela reforma da Previdência estadual promulgada em março pelo governo de João Doria (PSDB).
A ação, que corre na 10ª Vara da Fazenda Pública, solicita que sejam suspensos os efeitos dos artigos 30 e 31 da Lei Complementar Estadual nº 1.354/2020, que detalha as mudanças no Regime Próprio de Previdência Social dos Servidores Públicos do Estado, e também os efeitos do Decreto Estadual 65.021/20, publicado no Diário Oficial do Estado no último sábado (20/6). O decreto determina que podem ser aplicadas alíquotas progressivas nas aposentadorias e pensões caso haja “déficit atuarial no Regime Próprio de Previdência do Estado”.
A inicial, assinada pela advogada Lara Lorena Ferreira, do Departamento Jurídico da Adusp, pede o reconhecimento da inconstitucionalidade dos referidos artigos para que o Estado “se abstenha de implementar, em prejuízo dos representados [docentes da USP], o aumento e a progressividade das alíquotas de contribuição previdenciária”.
A ação qualifica de “confiscatória” a majoração da alíquota previdenciária estipulada pela reforma por instituir “progressividade abusiva, sem a criação de benefícios correspondentes ao aumento e sem a consideração atuarial da situação superavitária decorrente das elevadas contribuições”.
Na inicial, a Adusp recapitula os passos da reforma da Previdência do Estado, com a promulgação da Emenda Constitucional Estadual (EC) 49/2020 e da Lei Complementar 1.354. As alterações decorrem da reforma da Previdência em âmbito federal, consubstanciadas na Emenda Constitucional 103/2019. Com base na nova legislação federal, o artigo 30 da Lei 1.354 “majorou e instituiu alíquotas progressivas de contribuição previdenciária, na base de 11% a 16% da remuneração/proventos dos servidores públicos estaduais, aposentados e seus pensionistas”.
O texto gerou ainda a possibilidade de aumento da base de cálculo da contribuição previdenciária dos aposentados e pensionistas em caso de déficit atuarial, prossegue a arguição da Adusp, “determinando que a contribuição previdenciária não mais incida sobre o valor da parcela dos proventos que supere o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social, mas sim sobre o montante dos proventos de aposentadorias e de pensões que supere 1 (um) salário mínimo nacional”.
A análise do texto da lei, ao lado da atual conjuntura tributária imposta aos servidores ativos e aposentados e pensionistas, permite afirmar que “houve um aumento substancial das alíquotas de contribuição previdenciária, agora fixadas entre 11% a 16%, que incidirão sobre expressivo montante remuneratório dos servidores públicos sem que tenha havido qualquer comprovação atuarial de que seus benefícios são a causa do alegado ‘déficit previdenciário’ e, principalmente, sem a consideração de que parcela expressiva de sua remuneração será consumida por tributação, dada a cobrança simultânea do Imposto de Renda e de outros impostos, o que, de fato, demonstra abusividade fiscal das disposições trazidas na Lei Complementar 1.354/20”.
Essas imposições, postula a Adusp, “violam os direitos individuais constitucionais que protegem o contribuinte contra a abusividade fiscal”. Entre os princípios constitucionais violados pela nova legislação previdenciária do Estado, a inicial da Adusp aponta a irredutibilidade dos subsídios, a vedação ao confisco tributário, a exigência de correspondência entre majoração de contribuição e majoração de benefícios e a exigência de estudo atuarial.
“Tais medidas representam confisco”, defende a inicial, “o que é expressamente vedado no inciso IV do artigo 150 da Constituição da República Federativa do Brasil: ‘Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios; (…) IV – utilizar tributo com efeito de confisco’”. Decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) citadas na peça da Adusp referendam o entendimento da inconstitucionalidade da tributação confiscatória e da incidência de contribuição sobre o que não reverterá em benefício do contribuinte.
De acordo com a ação da Adusp, a fixação de até 16% de contribuição previdenciária, somada aos 27,5% de desconto do Imposto de Renda, “demonstra que até 43,5% dos rendimentos dos servidores públicos poderão ser consumidos por tributação”. Incluídos os impostos sobre o consumo e outros, “a carga tributária global suportada poderá devorar mais da metade da remuneração”, aponta a inicial.
Projetos não apresentaram os cálculos atuariais exigidos pela Constituição
A Adusp sustenta ainda que os projetos que deram origem à reforma da Previdência do Estado não apresentaram os cálculos atuariais exigidos pelos artigos 40 e 201 da Constituição Federal. “A justificativa da PEC [Proposta de Emenda Constitucional] 18, de 2019, que deu origem à Emenda Constitucional nº 49, não apresenta o estudo necessário, limitando-se a preconceitos e dados genéricos”, diz a ação.
A entidade cita decisão proferida em 1993 pelo STF segundo a qual, para tal estudo, exige-se “avaliação atuarial inicial e em cada balanço utilizando-se parâmetros gerais, para a organização e revisão do plano de custeio e benefícios”.
“Não se trata de mera orientação para a gestão administrativa. O estudo atuarial é requisito formal para a regularidade material das condições previdenciárias em qualquer regime, em especial quando objeto de alteração constitucional”, aponta a Adusp. “Ao não instruir a PEC 18/2019 — vício que contamina a emenda aprovada desde a origem — com o suporte atuarial próprio, que apontasse para a necessidade de redução de benefícios com aumento de alíquotas, pautado em análises de longo prazo com receita e despesa historicamente consolidadas e hermeticamente inseridas no cálculo atuarial, o Poder Executivo apresentou proposta constitucionalmente inválida, posto que evidente que o critério de equilíbrio atuarial não foi apresentado, com o que se manteve conivente o Poder Legislativo.”
Assim como em relação a outros itens abarcados pela reforma, o STF já publicou decisões estabelecendo que a majoração da alíquota deve necessariamente vir acompanhada de cálculo atuarial minucioso. “Esse requisito não é mera orientação e sim um requisito formal que deveria ter sido apresentado no projeto, o que leva a um vício insanável posteriormente”, denuncia a peça da Adusp.
A mesma situação, de acordo com a entidade, se constata na justificativa do Projeto de Lei Complementar (PLC) 80/2019, que deu origem à Lei Complementar 1.354. Esse caso foi ainda pior do que o da PEC 18, argumenta a ação, por sequer ter havido “justificativa passível de argumentação”, limitando-se o texto, “no claro intuito de impressionar o público, a apresentar um cálculo simplista que não detém qualquer embasamento em estudo técnico de viabilidade administrativa, financeira e atuarial”.
Não bastassem os dois institutos que estabeleceram a reforma, o governo estadual ainda editou na semana passada o Decreto 65.021, “que declara, meramente, o déficit atuarial da Previdência, sem nenhuma apresentação comprobatória”, valendo-se da atual crise social e sanitária “para comunicar a nova cobrança contributiva para aposentados e pensionistas no prazo de 90 dias”. Trata-se, qualifica a Adusp, de “uma verdadeira redução dos proventos” em meio a uma grande crise.
TJ-SP concedeu liminar suspendendo ao aumento para filiados do Sinafresp
A ausência dos cálculos atuariais “também viola o disposto no artigo 126 da Constituição Paulista”, no entendimento do desembargador Marrey Uint, da 3ª. Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), que no último dia 1/6 deferiu liminar ao Sindicato dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de São Paulo (Sinafresp) suspendendo o aumento e a progressividade da alíquota de contribuição previdenciária aos filiados da entidade.
Além de registrar que as justificativas do PLC 80/2019 não apresentavam o estudo atuarial, o desembargador afirma estranhar que “em matéria de tamanha importância não tenham ocorrido Audiências Públicas para discussão democrática do projeto da reforma, como soe [sic] acontecer com outras questões de relevância”. “Pode-se concluir”, prossegue Uint, “que, de fato, a elevação das alíquotas da contribuição previdenciária dos servidores não pode ocorrer com fundamento em genérica motivação de déficit previdenciário, na medida em que a falta de dados técnicos específicos impossibilita sobremaneira constatar se a proposição preserva ou não o equilíbrio financeiro e atuarial, além de não permitir a verificação de equivalência entre a contribuição sugerida e o correspondente benefício”.
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