Universidade
Chapas que concorrem à Reitoria não oferecem alternativa ao modelo imposto nas últimas gestões e propõem mais privatização; valorização das carreiras é tema constante, mas mecanismos não são detalhados
A Secretaria-Geral da USP divulgou na última quarta-feira (16 de setembro) as três chapas homologadas pela Comissão Eleitoral para concorrerem à eleição de reitor(a) e vice-reitor(a). A votação ocorre em turno único no dia 27 de novembro, por meio eletrônico, e formará a lista tríplice a ser encaminhada ao governador do estado para a escolha da chapa que assumirá a Reitoria da USP em 2026.
Não houve surpresa em relação aos nomes que já vinham se movimentando nos últimos meses para obter apoios às suas candidaturas, conforme publicou o Informativo Adusp Online em julho.
Pela ordem de apresentação no site da Secretaria-Geral, as chapas são as seguintes: “USP pelas Pessoas”, formada pelo pró-reitor de Graduação, Aluisio Augusto Cotrim Segurado (Faculdade de Medicina), e Liedi Légi Bariani Bernucci, ex-diretora da Escola Politécnica e ex-presidente do Instituto de Pesquisas Tecnológicas-IPT; “Nossa USP”, composta pela pró-reitora de Inclusão e Pertencimento, Ana Lúcia Duarte Lanna (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e de Design), e Pedro Vitoriano de Oliveira, diretor do Instituto de Química e ex-secretário-geral da USP, entre outros cargos que já ocupou na burocracia universitária; e “USP Novo Tempo”, formada por Marcílio Alves (Escola Politécnica), diretor-executivo da Fundação Universidade de São Paulo (FUSP) e representante dos(as) professores(as) titulares no Conselho Universitário (Co), e Silvia Pereira de Castro Casa Nova (Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária), diretora financeira da FUSP.
Em vários pontos os programas das chapas apresentam diagnósticos comuns, e também coincidem em citar áreas que merecem atenção imediata ou prioritária, embora variem na abordagem e na formulação de eventuais propostas. De modo geral, a leitura dos textos apresentados pelas chapas deixa a impressão de que os documentos são mais grandes “cartas de intenções” do que propriamente programas concretos e exequíveis em quatro anos.
Alguns dos temas comuns às três chapas dizem respeito à necessidade de desburocratizar a gestão, promover mudanças no ensino de graduação e pós-graduação, investir em políticas de sustentabilidade, melhorar e recuperar a infraestrutura, ampliar os programas de permanência estudantil e investir em saúde mental.
Com diferentes formulações, os programas defendem que é necessário aprofundar o diálogo e a interação com a “sociedade”, representada especialmente por órgãos dos três poderes e organizações do setor privado. A preocupação com a manutenção da autonomia universitária e o futuro do financiamento das universidades estaduais paulistas depois que entrarem em vigor as mudanças trazidas pela reforma tributária, além dos impactos das novas tecnologias no ensino e no mundo do trabalho, são aspectos presentes em maior ou menor grau nos programas.
Outro tema comum é o discurso da necessidade de valorizar o corpo de servidores(as) docentes e técnico-administrativos(as), tanto do ponto de vista do reconhecimento do seu trabalho quanto da melhoria salarial. No entanto, não fica claro em nenhum dos programas quais serão os mecanismos para que esses e outros objetivos sejam alcançados na prática.
Em vez de falar em democracia, programas citam “diálogo” ou “participação”
Os programas não apresentam propostas claras para a democratização da USP. Em geral, utilizam expressões como “diálogo” ou “maior participação” das diversas categorias na gestão, mas sem explicitar de que maneira isso seria feito.
Pouco se fala em ampliar a participação das categorias discentes e de servidores(as) nos conselhos e órgãos decisórios. A chapa M. Alves-S. Casa Nova propõe “aprimorar a representatividade nas instâncias decisórias da universidade e na gestão reitoral”, mas novamente não há explicação do que isso significa ou de como o objetivo seria alcançado.
Sintomaticamente, termos como “democracia” ou “democrático(a)” aparecem de forma rarefeita nos documentos. E, também de forma sintomática, não há menção ao princípio estabelecido pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de que colegiados encarregados da escolha de dirigentes devem ter no máximo 70% de docentes. Como demonstra a nota “A escolha da reitora ou reitor da USP e a urgente democratização da universidade”, publicada pela Diretoria da Adusp no início de setembro, o colégio eleitoral é composto em cerca de 90% por docentes.
Se a democracia não está em alta no discurso das chapas, o aprofundamento dos mecanismos de privatização na universidade é uma presença forte nos programas. Há referências a treinamento de docentes para captar verbas, aumento da interação com o setor privado e até aperfeiçoamento da relação da USP com as fundações privadas ditas “de apoio”.
Um bom termômetro nesse quesito é o uso dos termos-fetiche “inovação” e “empreendedorismo”, o primeiro deles amplamente citado pelos(as) candidatos(as). “Inovação” aparece 90 vezes nas 51 páginas do programa da chapa A. Lanna-P. Vitoriano. A chapa A. Segurado-L. Bernucci usa o termo 73 vezes nas 74 páginas do programa, enquanto a chapa M. Alves-S. Casa Nova é mais comedida: são “apenas” 30 menções nas 140 páginas do texto.
Da leitura dos programas, depreende-se que a gestão reitoral que assumirá em 2026, qualquer que seja a eleita, não trará mudanças significativas na condução da USP, até porque os nomes que compõem as chapas são fortemente ligados à atual gestão e às estruturas burocráticas e de poder da universidade. A tendência é de que sejam aprofundados os caminhos em curso nas últimas gestões, como a abertura cada vez maior a mecanismos de privatização, o foco nas avaliações de caráter produtivista e a adequação da USP, no discurso e na prática, a padrões exaltados pelo “mercado”.
O Informativo Adusp Online apresenta a seguir alguns tópicos dos programas das três chapas que concorrem à eleição reitoral da USP.
Chapa “USP pelas Pessoas”
A chapa de A. Segurado-L. Bernucci abre seu programa com a afirmação de que o “mundo acadêmico e a comunidade científica vivem momentos de incerteza, hostilidade e ameaças no cenário internacional e em nosso país”.
O documento faz uma espécie de defesa da gestão Carlotti Jr-Arruda, integrada por Segurado, ao dizer que a USP “reconhecidamente avançou em múltiplas dimensões”, entre elas a condução de seu “processo de avaliação institucional”.
O programa tem quatro eixos prioritários: “1) Valorização das pessoas, 2) Manutenção da excelência academia, 3) Fortalecimento da relação com a Sociedade e 4) Otimização dos processos técnico-administrativos.”
Quanto a valorizar pessoas, cabe lembrar que a candidata a vice-reitora, Liedi Bernucci, era diretora da Escola Politécnica quando ocorreu o acidente de trabalho que causou a morte do estudante Filipe Varea Leme, em abril de 2019. O jovem era aluno do curso de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) e fazia estágio como monitor de informática na Poli.
Ao atender à solicitação de uma funcionária para que executasse uma tarefa completamente alheia a suas atribuições — o transporte de um armário carregado de livros, num caso evidente de desvio de função — Filipe acabou atingido pelo carrinho de mudança no elevador de carga e morreu na hora.
A então diretora da Poli dissolveu a comissão de sindicância da escola que apuraria as responsabilidades no caso, eximindo-se de esclarecer as circunstâncias da morte do estudante e repassando a investigação para a Reitoria. A escola limitou-se a divulgar uma manifestação de pesar. Todas as iniciativas de solidariedade e assistência à família, como a realização de cerimônias em memória de Filipe e a cobrança de ações da Reitoria, partiram da FFLCH.
De forma resumida, o programa apresenta as propostas para a graduação organizadas em seis frentes: “Modernização Curricular e Metodológica; Permanência, Ambiência e Inclusão; Formação e Valorização Docente; Integração Ensino-Pesquisa-Extensão e Internacionalização; Gestão Acadêmica e Avaliação Institucional; Inovação, Sustentabilidade e Cultura Institucional”.
Na pós-graduação, há cinco frentes: “Reforço da Atratividade e Apoio à Permanência; Desenvolvimento de competências; Internacionalização, Monitoramento e Avaliação; e Potencialização do impacto social”.
Na área de Pesquisa e Inovação há nada menos do que oito frentes, sendo uma delas a criação do “Programa de Fomento à Pesquisa e Inovação de Base e de Livre Iniciativa”, cuja sigla é Probase.
A chapa propõe-se a implementar também “programas de acolhimento e mentoria para novos docentes, abordando procedimentos administrativos, estratégias de captação de recursos, integração em laboratórios multiusuários e em redes de pesquisa, entre outros temas relevantes de pesquisa e inovação” (destaques nossos).
A área de Cultura e Extensão está organizada em quatro frentes: “Valorização e avaliação, Sustentabilidade, Integração e Participação”. Já em Inclusão e pertencimento, a chapa lista oito frentes que “devem ser fortalecidas”, como “Apoio à inclusão e à permanência estudantil”, “Bem-estar no campus”, “Equidade de gênero” e “Inclusão de pessoas com deficiência”.
O programa também menciona a área de Internacionalização, com sete frentes. Na área de Gestão, são onze frente, entre elas a “Valorização das carreiras de servidores docentes e técnico-administrativos”, “Atenção à Saúde e benefícios a docentes e servidores técnico-administrativos”, “Infraestrutura, Obras, AVCB e Planos Diretores” e “Escritório de Inteligência Artificial e Transformação Digital”.
A chapa defende “a imperiosa necessidade de garantir a sustentabilidade da autonomia universitária plena”, cabendo à próxima gestão reitoral da USP “buscar ampliar conexões institucionais com os diferentes atores do mundo social, alinhando-os nesse propósito”.
O programa dedica espaço ao tema das novas tecnologias e diz que existe “necessidade premente de planejar e desenvolver ações institucionais que promovam o uso responsável, eficaz e pedagogicamente apropriado da Inteligência Artificial (IA), em particular da IA Generativa na USP. Tal medida aportará inovações importantes para o ensino, a aprendizagem, a pesquisa e a gestão acadêmica”. “O emprego racional e crítico de tais tecnologias tem potencial para ampliar a efetividade de processos pedagógicos e administrativos”, considera a chapa.
Por outro lado, o programa afirma que “a valorização da docência é uma ação estratégica”. “Prevê-se a reformulação dos processos de avaliação e progressão docente, com incorporação de critérios ligados à qualidade do ensino, inovação e impacto pedagógico. Também será assegurada e fortemente recomendada a formação pedagógica a docentes ingressantes nos primeiros anos de carreira, fortalecendo sua atuação desde o início” (destaques nossos).
A progressão vertical dos(as) docentes “seguirá pontuada pelos concursos de livre-docência e professor titular, enquanto a progressão horizontal será revista para permitir maior previsibilidade e continuidade, de acordo com o perfil acadêmico das Unidades e a disponibilidade orçamentária”.
A chapa afirma que haverá prioridade no início da gestão para a “discussão de parâmetros de valorização de carreiras de docentes e de servidores técnico-administrativos, buscando garantir a isonomia em relação a outras universidades estaduais públicas, quando possível, mas considerando particularidades dos contratos de trabalho e possibilidades de reconhecimento de atividades complementares”.
A promessa é de avaliar, “junto aos órgãos jurídicos e financeiros da Universidade e demais instâncias competentes, a viabilidade de instituir um programa especial [sic] de valorização das carreiras de servidores docentes e servidores técnico-administrativos, garantindo cumprimento rigoroso dos parâmetros de sustentabilidade financeira da Universidade”.
O programa admite ainda que “as últimas reformas previdenciárias modificaram as políticas de remuneração docente após a aposentadoria para uma parcela significativa de nossos professores e professoras”, e diz que a chapa se propõe a “discutir de forma participativa mecanismos de valorização que possam ser, mesmo que parcialmente, compensatórios às perdas ocorridas, compatíveis com a sustentabilidade financeira da USP”.
Chapa “Nossa USP”
A chapa de A. Lanna-P. Vitoriano considera que “o contexto atual impõe desafios à Universidade que conhecemos”, dadas as “transformações profundas na sociedade, com mudanças tecnológicas aceleradas, emergências climáticas e desafiadoras questões políticas e econômicas diante de um quadro de desigualdade social”.
“A nova lei tributária, que extingue o ICMS estadual, e a necessidade de constante reafirmação do repasse da arrecadação, trazem incertezas quanto ao futuro do financiamento público da própria universidade. É necessário, portanto, reafirmar o papel da USP como instituição pública, gratuita e de excelência”, diz o programa.
A chapa “parte do reconhecimento dos avanços recentes na gestão da universidade, mas é movida pela convicção de que podemos ir além”. “Queremos ampliar a integração entre as atividades-fim, aproximar a Reitoria das unidades e de todos os campi, simplificar processos, valorizar as carreiras de servidores técnico-administrativos e docentes, consolidar as políticas de inclusão e pertencimento, expandir as conexões da USP com a sociedade e com o mundo, fortalecer a atuação nos municípios onde está presente”.
Em relação à formação, a chapa propõe a existência de “caminhos formativos mais fluidos, tanto na horizontal (entre cursos e habilitações) quanto na vertical (entre graduação e pós-graduação), favorecendo a diversificação de percursos acadêmicos”.
Entre outros pontos, defende “receber os ingressantes dos cursos de graduação diurno e noturno de maneira receptiva, acolhedora e motivadora” e “oferecer letramento em empreendedorismo e inovação para estudantes da graduação e da pós-graduação” (destaques nossos).
Na área de “Capacitação”, o plano é “promover o desenvolvimento contínuo de servidores e docentes por meio de políticas institucionais de capacitação e formação, voltadas à inovação no ensino, ao fortalecimento da cultura de gestão pública universitária e à valorização dos saberes acadêmicos e profissionais” (destaques nossos).
A chapa propõe “consolidar uma política institucional de formação continuada para docentes por meio da ampliação do Programa de Desenvolvimento Profissional Docente (PDPD), com a criação do Escritório de Desenvolvimento do Ensino e da Aprendizagem (EDEA)” (destaques nossos).
A chapa que mais utiliza o termo “inovação” em seu programa afirma que “a inovação não é apenas tecnológica, mas também social, institucional e cultural”. “A interação com empresas, governos, organizações sociais e cidadãos é fundamental para a construção de soluções de alto impacto. A universidade deve cultivar um ecossistema aberto e colaborativo, com ambientes que promovam a cocriação, como centros de pesquisa, plataformas digitais, mercearias científicas, laboratórios vivos e equipamentos culturais”, ressalta. A chapa propõe a criação de programas como o “Conecta SP: Inovação com a Sociedade” e “Ecossistemas de Inovação USP”, além das “Mercearias Científicas”, “unidades de mediação entre a universidade e a sociedade civil”, voltadas especialmente a demandas de “organizações comunitárias, movimentos sociais e ONGs” (destaques nossos).
A chapa propõe também a criação de uma série de órgãos, como as superintendências de “Gestão de Pessoas” e de “Gestão Ambiental e Territorial”, o “Escritório de Apoio à Pesquisa” e a “Diretoria de Atividades Esportivas”.
Na área de “Pertencimento e Diversidade”, a chapa pretende “promover o aprimoramento e qualificação contínua das condições de moradia estudantil, por meio da articulação entre unidades”.
Num exemplo extremo de privatização, a chapa propõe “criar o selo ‘Moradia Estudantil Digna’ para parcerias com proprietários privados viabilizando melhores condições de moradia” (destaques nossos).
Como primeira titular da Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP), Ana Lucia Lanna ficou longe de atingir a meta de oferecer moradia estudantil qualificada nos quatro anos de gestão. O projeto de uma ampla reforma do Conjunto Residencial da USP (Crusp) foi abandonado, e o único bloco reformado foi o D. A situação do Crusp se manteve tensa durante a gestão, com conflitos internos entre moradores(as) e de setores destes(as) com a PRIP.
Em relação às carreiras, a chapa defende “o fortalecimento dos processos de progressão, com critérios claros, previsíveis e compatíveis com as múltiplas dimensões da vida universitária”. Também propõe “medidas que levem em conta diferentes realidades, como a progressão automática para Professor Doutor nível II quando da aprovação e finalização do estágio probatório”.
“As carreiras docentes são plurais”, diz o programa. Por isso, uma meta é “reconhecer e definir métricas e indicadores adequados para o reconhecimento da diversidade de caminhos e ênfases em ensino, pesquisa, inovação, extensão e gestão universitária, dando tranquilidade ao docente para fazer suas escolhas a cada projeto acadêmico e institucional”.
Outro item é “aperfeiçoar e garantir a manutenção do programa de progressão horizontal para docentes e servidores, assegurando periodicidade e planejamento”.
A chapa prevê ainda “fomentar o conhecimento e a previsibilidade dos processos avaliativos, os critérios avaliativos e a transparência dos processos”, “retomar negociações com governo estadual sobre previdência para criar um fundo complementar da USP” e “redefinir e analisar as funções e vinculações institucionais”.
A chapa também aborda a questão dos “benefícios e programas de incentivo”, com itens como “desenvolver métricas que permitam o uso de reservas técnicas institucionais fundacionais, permitindo o pagamento de bolsas de pesquisa, extensão, ensino e inclusão para docentes”, “criar instrumentos de valorização e ampliação de remuneração/gratificação RDIDP”, “ampliar os benefícios indiretos”, “pagamento de auxílio escolaridade para filhos até 12 anos” e “implementar incentivo remuneratório para docentes que ministram disciplinas nos cursos noturnos, valorizando esses profissionais e fortalecendo os cursos”.
Chapa “USP Novo Tempo”
O programa da chapa de M. Alves-S. Casa Nova se inicia com uma carta aberta que diz que, “mesmo como participantes de uma das universidades mais prestigiosas do mundo, e apesar das muitas conquistas recentes, experimentamos um período de insatisfações difusas”.
A Reitoria deve prover “uma gestão não piramidal que converse, que aprenda a dialogar com os inúmeros segmentos que compõem essa multitude de pessoas, todas ávidas por trocas de ideias, conceitos, saberes e toques humanizados”. “Fala-se aqui de uma gestão não imperial, não cardinalícia, pronta e ávida por escutar e agir em prol de uma sociedade e comunidade tão diversas” (destaques nossos).
Em relação aos e às docentes, afirma que é preciso “nos reconhecer e assumir vítimas de um sistema pecuniário injusto, com salários e benefícios não condizentes ao papel relevante que temos para com a sociedade”.
“Nós docentes temos que estabelecer relações horizontais com os demais agentes que constroem o cotidiano da universidade e precisamos praticar uma escuta atenta e respeitosa para que a comunidade cresça e se fortaleça cada vez mais”, diz o programa.
O discurso da chapa é o que mais estabelece parentesco com aquele do mundo corporativo e empresarial, talvez pela trajetória de seus componentes à frente da FUSP, fundação privada dita “de apoio” à USP. Essa influência está presente em propostas como “instituir o dia de folga (day off) no aniversário de servidores docentes e não docentes” e instalar “uma academia de ginástica moderna em cada campus”.
São três os “princípios estruturantes” do programa: “Compromisso com a Sociedade; Sustentabilidade Financeira, Social e Ambiental; Gestão Ágil e Transparente”. “Estes princípios devem ser traduzidos em um movimento constante de criar, formar, interagir e cuidar”, diz o texto.
A chapa defende a criação de um grupo de especialistas uspianos “para ajudar no processo regulatório da reforma tributária, bem como a formação de grupo de interlocução com a Assembleia Legislativa”.
A gestão “deve dar ênfase à desburocratização e à descentralização de processos e à delegação responsável de decisões, de forma a respeitar a autonomia e contemplar as especificidades e particularidades das unidades que compõem a universidade”.
Em relação à inovação, a chapa propõe a “necessidade de promover a inclusão das pequenas e médias empresas (PMEs), responsáveis pela maior parte dos empregos, no sistema de inovação USP, com ampla interação com Finep, Senai e Sebrae”, além de “fortalecer orçamentariamente a Agência USP de Inovação, seus polos nos campi e seu escritório de patentes” e “fortalecer orçamentariamente o InovaUSP e expandi-lo para todos os campi”.
A conexão mais explícita com a privatização da universidade está no ponto que diz que é necessário “continuar aperfeiçoando a relação das Fundações com a USP com vistas a facilitar a gestão de projetos de pesquisa, e dos processos de compras e prestação de contas”.
A chapa também quer “propor diretrizes unificadas” da USP “para a criação de cursos de especialização de longa duração, a partir de um diagnóstico das experiências já existentes, como, por exemplo, PECE, Pecege e outros cursos ofertados pelas fundações conveniadas”.
Ou seja: a Reitoria expandiria “parcerias” destinadas a promover cursos pagos, as quais se espelhariam na atuação do “Programa de Educação Continuada em Engenharia” (PECE), associado à Escola Politécnica, e do “Programa de Educação Continuada em Economia e Gestão de Empresas” (Pecege), associado à Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), de Piracicaba. Ambos oferecem cursos pagos graças aos quais faturam dezenas de milhões de reais por ano.
Outra proposta da chapa é que os “aportes estatutários das Fundações à Reitoria” — ou seja, a parcela ínfima de 10% de seus ganhos que as fundações ditas “de apoio” repassam à universidade — sejam a base de “um sistema de financiamento docente com uma parcela para uso pessoal e uma parcela para despesas ligadas à execução de seu projeto acadêmico (por exemplo: ida a congressos, material didático, material de laboratório, bolsas etc.) dentro dos limites da lei e dos parâmetros de sustentabilidade financeira”.
“No que concerne à valorização da docência universitária, ela requer o estímulo ao engajamento de professores e professoras em atividades da Graduação, em salas de aula, laboratórios, trabalhos de campo, viagens didáticas, estágios, iniciação à pesquisa e docência”, diz o programa.
A chapa propõe reformular “em particular, a CERT [Comissão Especial de Regimes de Trabalho] e a SEF [Superintendência do Espaço Físico]” para que atendem “as expectativas da comunidade”. A gestão Carlotti Jr.-Nascimento Arruda, que havia se comprometido a extinguir a CERT, não cumpriu a promessa.
A partir da página 106 de seu programa, que tem um total de 140 páginas, a chapa sistematiza todas as propostas apresentadas ao longo das diferentes seções. São 157 propostas, apresentadas em forma de itens, sem detalhamento. Entre elas estão as seguintes:
“Considerar a Assembleia Universitária, prevista no regramento da universidade, como mecanismo para o debate dos grandes temas da vida universitária.” A Assembleia Universitária é o colégio eleitoral que vota no pleito para reitor(a) e vice-reitor(a). É constituída pelo Conselho Universitário, Conselhos Centrais, Congregações das unidades e conselhos deliberativos dos museus e institutos especializados e representa apenas 2% do total da comunidade.
“Reformular as funções e a composição da CERT, que passa a atuar sob a coordenação da CAD [Câmara de Atividades Docentes]”; “revitalizar o Hospital Universitário (HU) e preservar seu papel de ensino”; e “estudar a criação do Centro de Formação de Docentes”, novamente sem explicitar o que seria isso, são outras propostas.
O programa segue: “envidar conversações com a Assembleia Legislativa para estruturar projeto com vistas a aumentar dos atuais 20% para 30% os cargos de Professor Titular”; “desenvolver tratativas com o Supremo Tribunal Federal (STF) para corrigir desconto previdenciário no caso dos docentes contratados no período entre 2003-2013”; “modernizar a carreira docente e do corpo funcional técnico-administrativo e de pesquisa” e “avaliar a possibilidade de valorização salarial para servidores docentes e não docentes, considerando os parâmetros de sustentabilidade financeira da universidade”; “instituir prêmios anuais de reconhecimento docente pela dedicação ao ensino, à pesquisa e à extensão”; e “criar, ampliar e manter pelo menos uma creche por campus”.
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